Toda vez que um candidato ao governo fala das principais obrigações do Estado, a saúde aparece elencada entre as prioridades, junto com educação e segurança. Se levarmos em conta as buscas feitas no Google, por exemplo, é o tema que mais interessa aos eleitores brasileiros. A página especial de eleições brasileiras na ferramenta Google Trends aponta que a saúde é o assunto relacionado ao pleito mais buscado no site ao longo de 2018.
No caso da corrida ao Palácio Piratini, a temática de fato tem um espaço importante nos planos de governo dos concorrentes. Apesar de cada um abordar à sua maneira, há alguns consensos entre os candidatos, como a defesa da regionalização do atendimento, com maior investimento no interior do Estado. Há também a ideia comum de que é preciso fortalecer a atenção primária e a prevenção de doenças. Entre os programas, há níveis maiores e menores de detalhamento sobre como isso será feito. Por outro lado, não há explicações detalhadas sobre como deve se dar o financiamento dos programas, se limitando, muitas vezes, à melhoria de gestão dos recursos atuais.
Saúde em pauta
Pela lei, os estados devem investir pelo menos 12% de seu orçamento e os municípios 15% em saúde. Já a União, segundo a Emenda Constitucional 86 de 2015, deve destinar 15% da Receita Corrente líquida para ações básicas em saúde.
Mas o que cabe a cada instância quando se fala em saúde pública? O que pode, de fato, fazer o governador eleito do RS? Cada ente federativo tem uma responsabilidade diferente com relação a saúde. Cabe à União coordenar sistemas de alta complexidade e laboratórios públicos, além do planejamento, fiscalização e transferência de recursos ao SUS. Cabe aos estados criarem políticas próprias de saúde e auxiliarem com recursos na execução de políticas nacionais. Também são responsáveis por coordenar rede própria de laboratórios e homocentros, definir hospitais de referência, gerenciar locais de atendimentos complexos na região e repassar verbas para municípios. Estes são os responsáveis pela atenção básica de saúde e pela prestação de serviços locais em parceria com governos estaduais e União. Prefeituras também podem criar políticas para a aplicação dos repasses. Devem, ainda, organizar e controlar laboratórios e hemocentros.
Para 2018, o orçamento da União destinava R$ 119,2 bilhões para a saúde. Para o ano que vem, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) aprovada no Congresso prevê um gasto em saúde na casa dos R$ 129,8 bilhões, o que representaria um crescimento acima da inflação.
A Lei do Teto de Gastos define que é possível aumentar as despesas em determinadas áreas, desde que o gasto global do governo federal esteja limitado à inflação. O temor dos contrários à medida é que isso possa impedir o crescimento dos investimentos necessários no Sistema Único de Saúde. Outra questão é que uma parte dos valores acaba não sendo executado. Ao final de 2017, o governo federal “devia” ao SUS mais de R$ 20 bilhões, que aparecem listados como “restos a pagar”.
A realidade estadual da saúde também apresenta percalços. Municípios cobram desde o início da gestão Sartori uma dívida, datada ainda da gestão anterior, que está hoje em R$ 478 milhões, segundo informa a Secretaria Estadual da Saúde. Ainda estão pendentes repasses na casa dos R$ 78 milhões para hospitais. A pasta informa que está em curso uma negociação entre a Casa Civil e a Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs) para o pagamento da dívida referente aos programas municipais.
Confira a seguir um resumo das propostas dos seis candidatos que registraram o plano de governo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para a saúde.
Governador José Ivo Sartori | Foto: Joana Berwanger/Sul21
José Ivo Sartori
O programa do atual governador dedica três páginas a propostas para a saúde, com foco em atenção básica, regionalização e presteza no atendimento. O plano aponta a precariedade do atendimento hospitalar de emergência e de tratamentos especializados como um gargalo do setor, que, em alguns casos, leva os usuários a esperarem por meses para realizarem consultas, cirurgias e revisões. A proposta do governo é melhorar a gestão e eficiência do sistema.
Em termos de promoção da regionalização da média e alta complexidade, o plano salienta que apenas 60% das necessidades de assistência e de procedimentos especializados são atendidas pela rede pública ou conveniada. A proposta é fortalecer o atendimento em cidades-polo, como Santa Maria, Ijuí, Passo Fundo, Caxias do Sul, Pelotas, Cachoeira do Sul, Santa Cruz do Sul e Lajeado.
No quesito da atenção básica, o programa propões ampliar a cobertura da Estratégia de Saúde da Família e do Primeira Infância Melhor, destacando ainda que o RS atingiu a menor taxa de mortalidade infantil do Brasil, com 9,97 óbitos para cada 1 mil nascimentos.
Eduardo Leite | Foto: Joana Berwanger/Sul21
Eduardo Leite
O plano de governo do candidato do PSDB dedica oito páginas à temática da saúde, defendendo uma gestão “ampla e sistêmica” do setor. “A missão do Estado gaúcho é esta: Investir nas melhores práticas de gestão da saúde pública, com uso de tecnologias modernas para agilizar o atendimento da população e garantir a universalização do acesso o mais perto possível da sua residência”, diz o plano de governo.
O programa elenca cinco prioridades: fortalecimento e expansão das redes de Atenção em Saúde, com foco na atenção primária; regionalização e hierarquização da Média e Alta Complexidade; Assistência Farmacêutica, com qualificação e padronização da relação de medicamentos essenciais, racionalização e melhor organização da distribuição de remédios; fortalecimento da Vigilância em Saúde para prevenção de doenças; e prevenção de Judicialização, com a adoção de medidas para que as pessoas não precisem recorrer ao poder judiciário para terem suas necessidades de saúde atendidas.
Miguel Rossetto | Foto: Joana Berwanger/Sul21
Miguel Rossetto
O programa do candidato do PT dedica quatro páginas específicas para tratar de questões da saúde. A abertura do trecho destaca que a Emenda Constitucional 95, que limita por 20 anos o crescimento dos gastos do governo federal à inflação, resulta na deterioração do SUS e no “abandono da saúde como um direito humano fundamental”. Por outro lado, faz a defesa da universalidade do SUS e do repasse de 12% do orçamento do Estado para a saúde. “Nosso conceito de saúde vai além da assistência, é um complexo produtivo que gera renda, emprego, trabalho, inovação tecnológica, ciência, conhecimento, desenvolvimento econômico e social”, diz
Em termos de propostas, faz a defesa da ampliação da atenção básica e da cobertura das equipes de saúde da família. Defende também a reforma psiquiátrica e o cuidado humanizado da saúde mental. Na linha da regionalização, defende a ampliação do SAMU, dotar as regiões com pronto atendimentos 24h para atender urgências, a criação de uma rede de especialidades, com policlínicas regionais.
Para melhorar o atendimento, propõe o programa “Saúde no Lugar e na Hora Certa”, com investimento em tecnologia para modernizar o agendamento e a gestão da informação. Propõe ainda um programa de recuperação e financiamento de hospitais de pequeno e médio porte, fortalecendo também a capacidade resolutiva de hospitais regionais.
Jairo Jorge | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Jairo Jorge
O programa do candidato do PDT traz propostas para a saúde dentro de diversas áreas, como no combate à desigualdade racial e o estímulo a uma nova indústria para o RS. Por outro lado, duas das 50 propostas do plano são específicas para a saúde.
A primeira delas é a regionalização da alta e média complexidade, com o estímulo à formação de consórcios de municípios para o atendimento, a criação de policlínicas regionais para reduzir os deslocamentos de pacientes e o estabelecimento de parcerias para a integração do sistema público com hospitais filantrópicos ou de pequeno porte.
A segunda é de impulso na atenção básica, com a proposta de aumentar o investimento para o controle de epidemias, no monitoramento e análise de dados e na prevenção a surtos. Também propõe o reforço de campanhas de informação, vacinação e prevenção, com foco em doenças cardiovasculares, respiratórias e decorrentes de maus hábitos alimentares. O programa de Jairo defende que os recursos para investimentos sairão de uma racionalização das despesas atuais.
Mateus Bandeira | Foto: Joana Berwanger/Sul21
Mateus Bandeira
O programa de governo do Novo dedica oito páginas à questão da saúde, destacando inicialmente que o sistema único sofre com poucos recursos e falta de gestão eficiente. A principal proposta é a ampliação de parcerias público-privadas (PPPs) para melhorar a eficiência na assistência.
Também identifica a necessidade de mudar o foco dos atendimentos especializados para a atenção primária, salientando que, para isso, é necessário investir em mecanismos como telessaúde e telemedicina. Propõe também potencializar a rede de pequenos hospitais do Estado, com a criação de um programa de apoio à gestão e recuperação financeira das instituições.
Com relação ao financiamento, destaca que, diante dos déficits fiscais atuais do Estado, “é improvável imaginar o aumento substancial do orçamento da saúde”. Por outro lado, diz que é preciso investir em inteligência e gestão para melhorar os resultados com os recursos disponíveis.
Roberto Robaina | Foto: Giovana Fleck/Sul21
Roberto Robaina
O programa do candidato do PSOL dedica 12 páginas específicas para a área da saúde. A abertura faz críticas ao que chama de falta de políticas de Estado para a saúde desde a criação do SUS, pela Constituição de 1988. “Pode-se dizer que o sistema foi feito a partir de “jeitinhos”. O subfinanciamento crônico e os interesses eleitorais foram determinantes para que o SUS não se tornasse uma política de Estado”.
O programa aponta o subfinanciamento como um dos maiores problemas do SUS, defendendo o investimento de 12% do orçamento no setor e se opondo ao Teto dos Gastos do governo federal. O plano também aponta que um futuro governo Robaina será comprometido com a regionalização da saúde para aprimorar o atendimento no interior do Estado. Para ampliar a assistência farmacêutica, defende a criação de um laboratório público e a compra de medicamentos por meio de consórcios, com o objetivo de redução de custos. Também ressalta o papel da universalização do saneamento básico como forma de prevenção de diversas doenças, como diarreias, leptospirose, dengue, zika, chikungunya, entre outras.
Ao fim, elenca ainda algumas prioridades, entre elas: abertura de novos leitos de internação, com prioridade na descentralização; tratar drogas como questão de saúde pública; apoio à reforma psiquiátrica e ao fechamento de manicômios; estabelecimento de jornadas de 30 horas semanais para trabalhadores da saúde; a estruturação de carreiras de estado; posição contrário à terceirização e à privatização no setor; e reversão da extinção da FEPPS (Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde), autorizada pela Assembleia Legislativa a pedido do governo Sartori em 2016.
Júlio Flores | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Julio Flores
O programa do PSTU ao governo do Estado está disponível apenas em página própria do partido, também mencionando políticas de saúde em diversas áreas. A seção dedicada especificamente ao tema faz uma crítica ao crescente aumento de repasses para a prestação de serviços privados. “O SUS é uma conquista da classe trabalhadora, os sucessivos governos vêm sucateando e cortando as verbas destinadas ao Sistema. A saúde universal, irrestrita e de qualidade é um direito da população brasileira. O SUS transfere milhões de verbas para hospitais, clínicas e laboratórios privados”.
A primeira proposta do plano é acabar com as transferências de verbas para o sistema privado. Também defende limitar em 30 horas semanais a jornada dos trabalhadores da saúde. O PSTU destaca ainda a necessidade de respeito à identidade de gênero na saúde, ampliando o acesso para transexuais. Por fim, traz como proposta o atendimento para doenças da população negra, mas sem se aprofundar no tema.