O Ministério da Saúde suspendeu,
nas últimas 3 semanas, contratos com sete laboratórios públicos
nacionais para a produção de 19 medicamentos distribuídos
gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Documentos obtidos
pelo jornal O Estado de S. Paulo apontam suspensão de projetos de
Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) destinados à
fabricação de remédios para pacientes que sofrem de câncer e
diabete e transplantados. Os laboratórios que fabricam por PDPs
fornecem a preços 30% menores do que os de mercado. E já estudam
ações na Justiça.
Associações que representam os
laboratórios públicos falam em perda anual de ao menos R$ 1 bilhão
para o setor e risco de desabastecimento - mais de 30 milhões de
pacientes dependem dos 19 remédios. A lista inclui alguns dos
principais laboratórios: Biomanguinhos, Butantã, Bahiafarma,
Tecpar, Farmanguinhos e Furp.
Além disso, devem ser encerrados
contratos com oito laboratórios internacionais detentores de
tecnologia, além de laboratórios particulares nacionais. Isso
porque cada laboratório público, para desenvolver um produto, conta
com dois ou três parceiros. Depois, esses laboratórios públicos têm
o compromisso de transferir a tecnologia de produção do medicamento
ao governo brasileiro. Essa lista inclui referências da indústria
como a GlaxoSmithKline Brasil Ltda. (GSK) e a Libbs, além de
Oxygen, Nortec, Biomm, Cristália, ITF, Axis e Microbiológica
Química e Farmacêutica Ltda.
Transitório
Procurado, o Ministério da Saúde
informou que as PDPs continuam vigentes. Segundo a pasta, foi
encaminhado aos laboratórios um ofício que solicita "manifestação
formal sobre a situação de cada parceria". O órgão federal ainda
informou que "o chamado 'ato de suspensão" é por um período
transitório", enquanto ocorre "coleta de informações".
O jornal, porém, teve acesso a um
dos ofícios em que o ministério é categórico ao informar o
encerramento da parceria. O documento, do dia 26 de junho, é
assinado por Denizar Vianna Araujo, secretário de Ciência,
Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde. A Bahiafarma
é informada que, com base em um parecer da Advogacia-Geral da União
e da Controladoria-Geral da União, "comunicamos a suspensão da
referida PDP do produto Insulina Humana Recombinante Regular e NPH,
celebrada com a Fundação Baiana de Pesquisa Científica e
Desenvolvimento Tecnológico, Fornecimento e Distribuição de
Medicamentos e solicitamos manifestação formal da instituição
pública quanto à referida decisão, no prazo improrrogável de dez
dias úteis".
O presidente da Bahiafarma e da
Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil (Alfob), Ronaldo
Dias, disse que os laboratórios já estão tratando as parcerias como
suspensas. "Os ofícios dizem que temos direito de resposta, mas que
a parceria acabou. Nunca os laboratórios foram pegos de surpresa
dessa forma unilateral. Não há precedentes", afirmou.
Consequências
O entendimento da associação de
laboratórios é que a entrega de remédios já programada continua
garantida. Isso significa que não deve haver interrupção imediata
no fornecimento.
Segundo ele, a maior parte pretende
fazer um questionamento jurídico. "A primeira medida que a gente
pretende tomar é no âmbito judicial. Nossa linha deve ser alegar a
arbitrariedade da forma que isso se deu."
Já o representante de um
laboratório de São Paulo, que falou com o Estado sob a condição de
não ter o nome divulgado, disse que a suspensão das parcerias vai
criar um problema de saúde e afetar uma cadeia econômica "imensa",
expondo o Brasil à insegurança jurídica.
Ele cita como exemplo uma planta
industrial no valor de R$ 500 milhões, construída em uma parceria
de um laboratório privado com o Instituto Butantã e financiada pelo
BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). "Essa
planta toda fica obsoleta. Toda cadeia econômica está severamente
afetada", disse.
'Desmonte'
O presidente da Bahiafarma e da
Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil (Alfob), Ronaldo
Dias, vê retrocesso para a indústria nacional de medicamentos e um
risco para a saúde de milhões de pacientes. O laboratório é um dos
que tiveram seus contratos suspensos. "É um verdadeiro desmonte de
milhões de reais de investimentos que foram feitos pelos
laboratórios ao longo dos anos, além de uma insegurança jurídica
nos Estados e entes federativos. Os laboratórios não têm mais como
investir a partir de agora. A insegurança que isso traz é o maior
golpe da história dos laboratórios públicos."
O representante do setor destaca
que as Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) também
funcionam como um regulador de preço no mercado. Ele explica que a
Bahiafarma, por exemplo, vende insulina a um preço três vezes menor
que laboratórios estrangeiros. Dias ressalta que um processo de
compra de medicamento no Ministério da Saúde costuma demorar até 11
meses para ser concluído. Por isso, haveria até risco de
desabastecimento. As informações são do jornal O Estado de S.
Paulo.