O “open insurance” é alguma coisa que ninguém sabe muito bem o que é, como funciona e para que serve
Diz a “carochinha” que era uma vez um inglês muito rico que tinha o cavalo mais famoso da Inglaterra. O inglês morreu, e seu filho herdou sua fortuna, inclusive o cavalo. Cheio de ideias inovadoras, o novo proprietário decidiu ensinar o cavalo a não comer. Passou um dia, passou uma semana, passou mais tempo e, quando ele achou que o cavalo tinha aprendido, o cavalo morreu.
O Brasil vive uma situação parecida com a do cavalo do inglês. Em nome da modernização do mercado e do aumento da competitividade, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) sacou de sua cartola o “open insurance”, alguma coisa que ninguém sabe muito bem o que é, como funciona e para que serve, mas que vai sendo estruturado, inclusive com a definição de prazos para entrar em vigor e a nomeação de pessoal para sua gestão.
O que causa espanto é a pressa com que o assunto está sendo tocado. Aliás, ele vai a reboque do “open banking”, uma criação do Banco Central para o sistema financeiro, que é completamente diferente do setor de seguros.
Dizem as más línguas que a Susep não teve chance de abrir a boca e que teve que engolir o tema do jeito que foi passado pela área econômica do governo. Seja como for, um dos pontos mais delicados, e que faz toda a diferença, é que o “open insurance” desconsidera o principal canal de distribuição de seguros do País.
No desenho original não tem o corretor de seguros, seja regulamentando a atuação do grande agente distribuidor das apólices brasileiras, seja como cogestor do “open insurance”, em parceria com os demais players já definidos.
O corretor de seguros é, legalmente, parte do “Sistema Nacional de Seguros Privados”. No entanto, no desenho da Susep, ele não faz parte do “open insurance”, pensado, desenvolvido e regulamentado, administrativamente, pela autarquia, que não tem o poder de criar, modificar ou alterar lei. Muito menos uma Lei Complementar, como é o caso do Decreto-Lei 73/66, que criou e regulamenta o “Sistema Nacional de Seguros Privados”. Mas foi o que ela fez, ao banir o corretor de seguros, como player e cogestor, do novo desenho pretendido como solução inovadora para o setor.
Os antigos russos, os primeiros cidadãos da falecida União Soviética, sentiram na pele o que é ter um governo que gosta de fazer experiências e adotar soluções inéditas, pensadas e desenvolvidas por burocratas sem qualquer noção do mundo real. Mais de 20 milhões de soviéticos morreram durante os vários experimentos feitos, principalmente no período em que foi governada por Josef Stalin.
Brincar de Deus é perigoso. Cada vez que o ser humano faz isso, acaba mal. Para quem acha que persigo Stalin, Hitler fez a mesma coisa com as mesmas consequências. Quem pagou a conta foi o povo alemão.
O corretor de seguros não é o maior canal de distribuição de seguros do país porque um dia o Arcanjo Gabriel desceu do céu e escreveu com letras de fogo nas encostas do Pão de Açúcar que era assim que deveria ser. O corretor de seguros está onde está pelo empenho e pela competência de toda uma categoria que, nos últimos 70 anos, tem se esforçado para fazer seu papel, trabalhar profissionalmente e, através do aconselhamento do segurado e da colocação das apólices das seguradoras, contribuir diretamente para a consolidação do setor de seguros no Brasil.
As seguradoras não optaram pelo corretor porque ele é bonito. Ao contrário, durante anos houve uma guerra feroz entre as seguradoras ligadas a conglomerados financeiros, que vendiam seus seguros através das agências dos bancos, e os corretores de seguros. Os corretores ganharam e são os maiores canais de distribuição dessas companhias porque eles são mais eficientes.
Mexer radicalmente numa atividade vitoriosa como é o setor de seguros é um risco tremendo, e não existe nenhuma certeza de que a Susep tem competência para isto. Seria mais sensato, antes de fazer experiências mirabolantes, a autarquia combinar as regras com todos os participantes do jogo, até porque eles sabem muito mais do que ela. E ouvir nunca fez mal a ninguém.