A rotina é de quem tem pressa. Muito para pouco tempo. A mesa quase não aparece sob papéis e documentos. As duas mãos da corretora de seguros dividem-se com o teclado do computador, telefone e uma xícara de café. Enquanto lê um e-mail, fala com uma cliente e faz orientações.
Viviane Coelho trabalha com seguros há 15 anos. O escritório do pai, em Santo André, começou pequeno. Hoje, a Scaramel possui 2 mil clientes. O objetivo da empresa, de acordo com Viviane, é fazer parte do futuro das pessoas e, assim, ter clientes fieis. “Ser para a vida inteira das famílias. Para isso, é preciso confiança e cumplicidade. O corretor deve ser bom consultor, indicar as melhores oportunidades”, diz.
Viviane é um dos 60 mil corretores de seguros espalhados pelo Brasil. Um mercado que representa cerca de 6% do PIB nacional e movimenta bilhões de reais. Mais da metade do montante ligada ao setor de automóveis. “Um dos nossos maiores desafios é mudar a percepção de que o carro é prioridade. As pessoas deveriam pensar antes no seguro de vida e no de saúde”, comenta.
Cotação em minutos
Nos últimos tempos, outro desafio para a categoria é a convivência com as novas tecnologias. A cotação online, por exemplo, traz concorrência a quem vende e novidades a quem compra o serviço. O procedimento é comum na Europa, mas ainda traz dúvidas e divide opiniões no Brasil.
Atualmente, há diversos sites especializados na venda de seguros que oferecem pesquisa de preço e uma apólice em poucos minutos. Longe da figura tradicional do corretor, o consumidor age de modo mais autônomo diante do notebook. A diferença de método acarreta reflexões sobre a importância do profissional de seguros, além da eficácia e qualidade do produto vendido pela internet.
Para Alexandre Mantovani, integrante do Sindicato dos Corretores de Seguros no Estado de São Paulo (Sincor-SP), o mercado brasileiro ainda não é maduro para a compra direta. “Acredito que a venda de seguros online funcione para produtos simplificados, como smartphones: um caminho rápido, sem muitas opções e detalhes. O serviço para automóveis é mais complexo. Diversas informações são necessárias para o consumidor efetuar a melhor escolha, entre coberturas, assistências, carro reserva etc”, explica Mantovani, coordenador da Comissão Corretores de Seguros do Futuro.
Falta identidade
Mário Sérgio de Almeida Santos, presidente do Sincor-SP, tem a mesma opinião. Apesar de valorizar os benefícios e a importância da tecnologia, Santos afirma que a venda online é interessante apenas para o consumidor experiente. “Os sites não oferecem assessoria, não identificam o real perfil do comprador. Coisa que se identifica somente numa conversa entre o corretor e o cliente. A venda online representa, hoje, 1% do mercado”, complementa.
Mesmo com uma fatia relativamente pequena, mas representativa num mercado que movimenta bilhões de reais, os sites de cotação online se multiplicam. O portal TaClaro é exemplo. Está em atividade há pouco mais de um ano no Brasil, sob responsabilidade de três sócios: um alemão e dois portugueses. Um deles é João Cardoso, que deixou o mercado financeiro em Londres para se dedicar à venda de seguros.
De acordo com o empresário, a criação da nova classe média brasileira expandiu as possibilidades. “Há cada vez mais carros nas ruas e, por consequência, cresce o número de segurados”, afirma. Para Cardoso, a comercialização tradicional e a online podem conviver bem, pois há dois tipos de consumidores. “O que não abre mão do corretor e aquele que acredita que, com a internet, ganha em dinamismo e autonomia. Ambos, à sua maneira, buscam bom atendimento”, diz.
Uma das vantagens dos portais é a facilidade em chegar a todo País. Uma das desvantagens é lidar com a desconfiança do cliente, que muitas vezes duvida da legitimidade da empresa. “Tem gente que exige vir até nosso escritório, para saber se existimos mesmo. Mas procuramos dar bom atendimento via internet e telefone, não se restringindo a simples call center. O cliente pode fazer tudo online, mas os funcionários são treinados para confirmar dados e dar orientações sobre os seguros. E não necessariamente vender o mais barato”, afirma Cardoso.
Prós e contras
A guerra de preços é um dos argumentos de quem defende a presença do corretor. Como ainda não há legislação específica para a venda online, alguns acreditam que a busca pelo valor mais baixo vai deixar de lado a complexidade e a qualidade dos contratos e coberturas, num eventual sinistro.
O tipo de comercialização disseminou-se na Inglaterra, chegou ao auge, mas depois teve de conviver com a instabilidade e queda na eficácia dos seguros. “As estratégias predatórias entre os concorrentes nivelaram os seguros por baixo. Vendia-se preço e não serviço. Com isso, muitas corretoras faliram e o mercado ficou sucateado”, opina Alexandre Mantovani.
Marcelo Blay, diretor da Minuto Seguros, corretora em operação há um ano e meio na internet, concorda que o tipo de relação comercial exige detalhamento para que o cliente e a seguradora não saiam prejudicados. “A venda de seguros é predominantemente consultiva. Por isso, depois do procedimento online, entramos em contato para levantar as reais necessidades, tirar dúvidas e buscar a melhor relação custo-benefício”, explica.
O empresário, que deriva do mercado tradicional, aposta na versatilidade e praticidade dos sites, que permitem fazer simulações de cobertura, mas não descartam a presença humana. “É na conversa por telefone que conseguimos capturar informações extremamente relevantes para oferecer o melhor serviço. Esse suporte tem dado resultado”, conta Blay.
Redução do tempo
Morador de Guarulhos, Rubens Souza é servidor público estadual. Ao contratar seguro para o automóvel na internet levou em consideração a praticidade. “Hoje em dia, tudo é mais corrido. Em pouco tempo, fiz pesquisas e tive na minha tela 12 cotações”, diz.
Souza se considera satisfeito com o serviço, mas ressalta que tomou precaução. “Há muita gente querendo levar vantagem no mercado, principalmente, na rede. Então, antes de tudo, pesquisei o nome das empresas em sites especializados em reclamações e chequei o registro da corretora na Susep, a Superintendência de Seguros Privados”, conta.
Segundo o Sincor-SP, a precaução de Souza é importante, mas não basta. Nos casos em que dispensa o corretor de seguros, o cliente fica mais vulnerável a cometer erros. Diante disso, a fim de evitar transtornos, deve indicar precisamente as informações do perfil, conferir todos os serviços inclusos no contrato, verificar se o site passa informações didáticas e checar se oferece bom atendimento para dúvidas e urgências.
Os corretores de seguros apostam na expansão do mercado online, porém acreditam que o consumidor vai permanecer usuário do modelo tradicional de consultoria. “A variedade e a complexidade na compra de seguros são amplas e as pessoas, em geral, não querem se preocupar. Vão preferir pagar para ter a comodidade e a segurança, de que o corretor de seguros providenciará tudo sem erros. O corretor de seguros e continuará um intermediário necessário”, opina Alex Arruda, membro da Comissão Corretores de Seguros do Futuro.
Reação à venda online
Em reação ao crescimento e à agilidade que a internet proporciona na venda direta de seguros, o Sincor-SP desenvolve um software de uso exclusivo dos corretores para reduzir o tempo das cotações no setor de automóvel. A medida representa uma forma de dar respostas ao consumidor rapidamente sem eliminar a participação efetiva do corretor durante o processo.
Mário Sérgio, presidente do Sincor-SP, adianta que a ferramenta dará agilidade e perfeição no cálculo, que, em geral, leva uma hora e cinco minutos para ficar pronto. “Com o sistema, o cálculo sai em apenas dois minutos, o que aumenta a chance de o consumidor fechar o seguro com o corretor”, calcula.