Especialistas e deputados pedem políticas públicas para aumentar profissionalização da categoria, ainda considerada ‘obrigação da mulher’
O papel da mulher – que representa 98% do universo de cuidadores – e as políticas públicas para esse profissional foram debatidos nesta terça-feira (15) em audiência realizada pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. O debate sobre a Política Nacional de Cuidadores priorizou a necessidade de romper o paradigma patriarcal de que cabe à mulher cuidar gratuitamente de idosos e doentes.
Segundo a representante da Secretaria de Políticas para Mulheres, Vera Soares, evitar que o trabalho do cuidador seja entendido como de natureza feminina e gratuito é um dos desafios dos formuladores da Política Nacional de Cuidadores.
Para ela, as atividades desempenhadas pelos cuidadores não podem ser rotuladas como próprias da mulher, “é necessário estimular a profissionalização, por meio de cursos técnicos, que capacite o cuidador a oferecer o serviço com qualidade”. “Não podemos alimentar o discurso tradicional, pelo qual o cuidador é uma figura feminina equiparada à empregada doméstica”, afirmou.
Vera Soares mencionou o Japão e a França, onde as políticas públicas atenuaram o caráter “invisível” do cuidador e possibilitaram a criação de nichos de mercados para o setor.
Atribuições
Segundo a deputada Erika Kokay (PT-DF), as mulheres ainda cumprem essa função de forma solitária, sem amparo de políticas públicas. A deputada também enfatizou a necessidade de distinguir o cuidador doméstico do profissional. “Devemos trabalhar numa perspectiva dupla: de um lado, possibilitar que os cuidadores domésticos sejam remunerados; e, de outro, tornar flexível a jornada de trabalho para os cuidadores profissionais”, disse.
Kokay argumentou que a inclusão da categoria no Sistema Único de Saúde (SUS) pode universalizar o serviço.
Já a representante do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Deusina da Cruz, enfatizou a pluralidade de atribuições dos cuidadores. Conforme ela, é preciso distinguir as diversas demandas exigidas no serviço, que abrange a rotina de exames e o convívio social com os assistidos.
O aspecto de “profissional híbrido” foi apontado pela representante do Ministério da Saúde, Cristina Hoffmann, como fator importante para entender as diferentes realidades de cuidadores de idosos profissionais – que atuam em entidades especializadas – dos cuidadores familiares – dos quais 98% são mulheres.
Capacitação
Em sua exposição, a diretora de Projetos do Instituto Baresi (organização direcionada a pessoas com doenças raras), Adriana Dias, defendeu políticas públicas de amparo ao cuidador, nos âmbitos da saúde psicológica, do convívio social e da geração de renda.
Para a diretora, que é portadora de nove tipos de doenças raras, os “profissionais devem ser capacitados para atender às necessidades de 15 milhões de famílias, que sofrem com o alto custo dos diagnósticos e a exclusão social”. Segundo ela, as “famílias raras”, núcleo familiar que convive com o doente, têm o “direito de serem cuidadas” e de dispor de serviços de alta qualidade.
Benefícios
O coordenador-geral de Estudos Previdenciários do Ministério da Previdência Social, Emanuel de Araújo Dantas, disse que a criação de benefício previdenciário para os cuidadores, semelhante ao existente para os aposentados por invalidez, não pode ser feita de imediato, por depender de estudos sobre a disponibilidade orçamentária.
Para a coordenadora de Certificação e Orientação Profissional do Ministério do Trabalho e Empego, Mariângela Coelho, incluir os cuidadores na classificação brasileira de ocupações (CBO) é importante para consolidar o perfil profissional dos cuidadores e direcionar a eles cursos específicos.
O deputado Renato Simões (PT-SP), que solicitou a audiência, afirmou que a criação de grupo interministerial, de que participará a sociedade civil, e a realização de novo debate em dezembro são os próximos passos para a criação da Política Nacional de Cuidadores.