Brasília – Ao que parece, a
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está mais empenhada na
fiscalização sobre os planos de saúde, já que os números de multas
aplicadas pela autarquia contra as operadoras já é 11% maior neste
primeiro semestre de 2016 do que em todo o ano de 2015. Só em meio
ano, as penalidades já deverão adicionar mais R$ 612,6 milhões aos
cofres da agência reguladora. Apesar disso, a aplicação excessiva
de multas não garante melhora na qualidade do serviço e pode fazer
com que o consumidor pague mais pelos planos
contratados.
No primeiro semestre deste
ano, a ANS já realizou 6.355 multas contra planos de saúde. O
número é menor que o ano inteiro de 2015, que teve 6.430
penalidades. Porém, o valor das multas de janeiro a junho deste ano
já superou a quantia do ano passado inteiro, com R$ 60 milhões a
mais. Em 2015, as penalidades ficaram em R$ 551 milhões. Neste ano,
R$ 29,5 milhões foram pagos no primeiro semestre deste ano,
restando o reembolso de R$ 583,2 milhões.
Os principais temas relacionados às
penalidades aplicadas são decorrentes de reclamações relacionadas à
autorização para realização de procedimentos, rede de atendimento,
além de suspensão e rescisão contratual. A ANS atribui esses
aumentos às novas regras estabelecidas pela Resolução Normativa
388/2015, vigente desde fevereiro de 2016, que visa incentivar as
operadoras de saúde a cumprir obrigações quanto à qualidade do
atendimento junto ao beneficiário com mais celeridade.
RECLAMAÇÕES Se
depender da empresária Juliana Moreira, de 55 anos, o número de
multas contra operadoras deve aumentar. Ela está insatisfeita com o
preço elevado cobrado pelo seu plano de saúde individual e já está
com material pronto para realizar a reclamação via ANS. “Já
conversei várias vezes com a empresa, reclamei, mas não obtive
resultado. O que eu vou fazer agora é juntar todas as ligações e
e-mails feitos e oficializar tudo na ANS para ver se abaixa o
valor”, disse.
Sem citar preços, Juliana afirmou
que os valores não condizem com o serviço prestado e com a
necessidade recorrente que tem no dia a dia. “É difícil pagar um
valor altíssimo por um plano e ele não te oferecer tudo que é
preciso. Deveria ser um atendimento mais amplo e sem muitas
restrições que tem hoje”, alegou.
Rodrigo Araújo, advogado e
especialista na área, explicou que, muitas vezes, os valores altos
dos seguros de saúde podem não ter escapatória para o consumidor,
devido à política de reajustes do mercado e a escolha de preços das
empresas. “No plano coletivo, as operadoras têm liberdade para
escolher os custos para adquirir e manter o plano sem a
interferência da ANS. Já no individual, as empresas optam por
cobrar mais caro, já que custa mais mantê-lo e a autarquia estipula
o limite de reajuste”, destacou.
Outras pessoas insatisfeitas com a
operadora de saúde são o casal Márcia Amorim, de 35, e Haroldo
Amorim, de 36. Ela trabalha com fotografia e ele como chefe de
cozinha. Ambos reclamam da dificuldade de achar clínicas e
hospitais credenciados pelo plano de saúde. “Quando precisamos,
temos percorrer um longo trajeto e sair à procura de locais
credenciados. Isso demanda tempo. O número de credenciamentos tinha
que ser maior”, relatou.
O comerciante Antônio Moris também
tem críticas, mas em relação à demora na marcação de consultas,
exames ou cirurgias. Ele perdeu a conta de quantas vezes ficou sem
paciência devido aos atrasos. “Considero meu plano de saúde muito
bom, mas teve uma consulta que eu precisei marcar, mas devido à
demora no agendamento eu decidi pagar do meu próprio bolso. Tive
que resolver o problema de uma vez”, alegou.
DESPROPORCIONAL O
presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge),
Pedro Ramos, acredita que a Resolução Normativa 388/2015, que
possibilitou o aumento de multas, é positiva porque traz mais
clareza e transparência ao consumidor, mas contesta as aplicações
das penalidades. “O princípio está absolutamente incorreto. Quanto
maior o número de beneficiário, faturamento e tamanho da empresa,
maior será o valor cobrado na multa. A empresa que é maior e tem
mais clientes consequentemente terá mais reclamações e mais
penalidades. Isso traz uma aplicação desproporcional e situações
problemáticas para o próprio mercado”, criticou.
Na visão da Federação Nacional de
Saúde Suplementar (FenaSaúde), a aplicação da multa deve estar
revestida de equilíbrio, porque o valor pago pelas empresas é
refletido no preço do produto e ao final quem acaba punido é o
próprio beneficiário. A entidade informa ainda que há, muitas
vezes, abertura de processos administrativos sem indícios da
infração que justifique, resultando, em valores irreais de multas
para as empresas em alguns casos.
A ANS informa que no período
imediato anterior ao início do processo de retirada de uma
operadora do mercado, a seguradora pode ter maior incidência de
multas justamente devido à falta de prestação de serviços que
ensejaram o seu fechamento.
Receita em alta apesar da crise
A FenaSaúde divulgou nesta semana
que, mesmo com a crise econômica, mais de 1.100 operadoras de
planos de saúde no país tiveram R$ 38,9 bilhões em receitas no
primeiro trimestre de 2016, crescimento de 10,3% na comparação com
o mesmo período de 2015. As despesas assistenciais ficaram em R$
30,7 bilhões de janeiro a março deste ano, alta de 10,7%.
O advogado Rodrigo Araújo
afirma que é estranho que, mesmo com o aumento de multas aplicadas
e queda no número de usuários, as maiores operadoras estejam com
lucros maiores que no trimestre do ano de 2015. “São várias as
empresas que mantém os lucros expressivos. As grandes empresas
tiveram no primeiro trimestre de 2016 o dobro, triplo e até o
quádruplo que obtiveram no trimestre anterior”, frisa.
O advogado atribui que as operadoras estejam repassando a
conta da crise ao consumidor, que recebeu reajustes médios de 20%
neste ano. “É o consumidor que está pagando as multas e os
prejuízos. Representantes das operadoras sempre reclamaram dos
índices de reajuste e multas aplicadas, mas os dados mostram que,
ano após ano, as empresas continuam tendo lucro mesmo com a crise
financeira e com todos esses problemas de perda de usuário. A única
justificativa é que eles estão repassando a conta ao consumidor”,
afirmou.