As chamadas administradoras de
benefício têm como atribuição fechar o contrato entre o
beneficiário e a operadora, emitir boletos e negociar reajustes,
entre outras. São companhias como Qualicorp, Aliança e AllCare,
entre outras.
De 2009, quando a atuação delas foi
regulamentada pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), até
junho deste ano, elas passaram de 22 para 140 empresas.
A receita delas, de 2011 a 2017,
aumentou 146%, passando de R$ 665 milhões para R$ 1,6 bilhão, em
valores corrigidos pela inflação. O crescimento ocorreu inclusive
nos anos de 2015 e 2016, quando os planos perderam clientes devido
à recessão.
Os dados constam do mais recente
Prisma Econômico Financeiro da Saúde Suplementar, publicação
trimestral da ANS que, pela primeira vez, destaca os dados desse
setor.
Ao mesmo tempo em que cresciam em
número e receita, as administradoras também ganharam relevância
no financiamento eleitoral.
Artigo dos professores Lígia Bahia, da
UFRJ, e Mário Scheffer, da USP, mapeou o fenômeno. Entre as
intermediárias dos planos, sobressaiu-se a Qualicorp, empresa que
domina mais da metade desse mercado, com 4,5 milhões de clientes,
segundo relatório de demonstrações financeiras de 2017.
Em 2010, a companhia fez doações de R$
1,9 milhão —R$ 1 milhão para a campanha de Dilma Rousseff (PT) e o
restante para campanhas do PSDB. Em 2014, as doações foram a R$ 6
milhões —dois terços para Dilma e o restante para o comitê
tucano.
Em 2009, um ex-presidente da empresa
foi indicado por Lula para a ANS e chefiou a agência de 2010 a
2012.
Na eleição de 2010, a administradora
Aliança, posteriormente comprada pela Qualicorp, também fez
doações, no valor de R$ 306 mil, principalmente a candidatos a
deputado. Na eleição de 2014, o então proprietário da Aliança foi o
maior doador individual da campanha deRicardo
Barros (PP) para deputado federal, com R$ 100 mil.
Em 2016, Barros tornou-se
ministro da Saúde no governo Michel Temer(MDB).
DOAÇÃO NÃO
INTERFERE NO NEGÓCIO, DIZEM EMPRESAS
A Associação Nacional das
Administradoras de Benefícios (Anab) diz que houve "contribuições
pontuais" de associadas, mas que o negócio depende só de clientes
privados.
A Qualicorp reforçou o argumento e
disse que "jamais houve qualquer medida regulatória que tenha
favorecido a companhia". Afirmou, assim como a Anab, que seu modelo
baseia-se na organização de consumidores em grandes carteiras para
obter melhores condições de cobertura e preço nas negociações com
as operadoras.
De fato, as administradoras se
beneficiam da expansão do mercado
de planos coletivos no Brasil. Um dos fatores que explica isso
é que, como a ANS não estabelece limite de reajuste
para os coletivos, eles têm um leque de oferta maior e com
preços mais atrativos.
Quem precisa de um plano, mas não tem
o benefício pelo trabalho, recorre aos planos por adesão. Eles são
intermediados por administradoras com contratos tanto com
sindicatos tradicionais como com entidades que reúnem grupos
genéricos como o de profissionais liberais.
Para ter o plano, o consumidor se
vincula a uma dessas entidades. Para críticos, é uma "adesão
simulada".
"Qualquer gestão que não mova uma
palha para regular esse mercado ajuda [as administradoras]", diz
Scheffer.
Ele e Lígia Bahia apontam duas
resoluções da ANS como determinantes para o crescimento das
administradoras.
Elas foram publicadas um ano antes da
campanha de 2010 e permitiram a atuação dessas empresas na venda de
planos coletivos e estabeleceram suas responsabilidades.
O Prisma Econômico-Financeiro da Saúde
Suplementar da ANS ressalta que, "a partir de 2009, observa-se um
crescimento significativo no número de administradoras. Ainda que
este crescimento tenha desacelerado em período mais recente, ele
não parece ter esgotado seu fôlego por completo até o
presente."
Em nota, a ANS afirmou que as
administradoras já existiam e que sua atuação teve o objetivo de
organizar o serviço, que é facultativo.
A agência disse entender que as
administradoras podem ajudar na negociação dos reajustes com as
operadoras, pois um aumento muito alto poderia acarretar fuga de
clientes para as administradoras.
A interpretação não é consenso. Como
as administradoras são remuneradas por modelos que incluem um
percentual da mensalidade, pode haver conflito de interesses, diz
Rafael Robba, advogado do escritório Vilhena Silva. "Em muitos
momentos, o papel da administradora se confunde com o da operadora.
Não sei até que ponto [a administradora] negocia representando os
consumidores."
O crescimento das administradoras
colocou-as também no foco deações
contra planos. Maria Cristina Cavini recorreu ao escritório de
advocacia contra a decisão de uma administradora porque sua mãe,
Isaura, 84, precisava de uma cirurgia abdominal, mas o plano não
tinha a estrutura adequada. Ao tentar a portabilidade para outra
operadora, a Qualicorp negou o pedido.
À Justiça, a empresa disse que não
caberia a ela figurar como ré da ação, porque só atua como
administradora, e que Isaura não havia apresentado a documentação
necessária, entre outros argumentos. O juiz discordou e determinou
a portabilidade sem cumprimento de carência.
Nos bastidores, parte das operadoras
de saúde vê o negócio das intermediárias com desconfiança.
Executivos reclamam que suas empresas são responsabilizadas por
falhas das administradoras.