Não se trata de uma ameaça, mas sim de um alerta. Médicos em
todo o Brasil informam aos 48 milhões de usuários de planos de
saúde que poderá haver a suspensão de serviços daquelas operadoras
que não cumprirem as reivindicações mínimas expostas pelas
entidades da classe: CFM (Conselho Federal de Medicina), AMB
(Associado Medica Brasileira) e Fenam (Federação Nacional dos
Médicos). O dia marcado é 25 de abril, que será conhecido como o
Dia Nacional de Alerta aos Planos de Saúde.
Os médicos não pretendem apenas o reajuste nos valores das
consultas e dos procedimentos, desejam a hierarquização dos
procedimentos com base na CBHPM (Classificação Brasileira
Hierarquizada de Procedimentos Médicos) e a criação de um indexador
que permita o reajuste da tabela de serviços com a mesma
periodicidade do aumento das mensalidades dos usuários. O objetivo
da classe médica é não ficar sempre refém da economia e da boa
vontade das operadoras em negociar.
Outro problema, que possibilita inclusive punições arbitrárias
pelas operadoras, são os descredenciamentos unilaterais e sem
justificativa. Por fim, os médicos querem a extinção de uma prática
temerosa que traz problemas aos usuários, aos profissionais e aos
estabelecimentos de saúde: as glosas de procedimentos médicos
realizados e que estejam previstos no rol da Agência Nacional de
Saúde Suplementar (ANS) ou da operadora ou que tenham sido objeto
de autorização prévia.
Como se trata do terceiro ano em que os profissionais se
organizam pela mesma causa, em razão da resistência das operadoras
em negociar, vários desistiram da luta e resolveram simplesmente se
descredenciar, o que não deixa de ser a mais contundente das
medidas que o médico poderia tomar. Por outro lado, a operadora
credenciará outro profissional que se submeterá a perceber uma
baixa remuneração, o que pode ser aceito por recém-formados, mas
não por profissionais mais experientes. No entanto, não se pode
dizer que a operadora ganhe nessa equação: médicos inexperientes
gastam mais com exames desnecessários, além de haver mais riscos de
os pacientes precisarem de mais consultas para que seja
diagnosticada a doença dos que recorrem a eles. Ou seja, não se
quer que as operadoras sejam “boazinhas” ou desempenhem atividade
sem lucro, mas uma justa prestação de serviços, em que todos ganhem
em qualidade e eficiência.
Acrescente-se a isso o fato de que os médicos já se mostraram
contra, em diversas ocasiões, as chamadas intervenções antiéticas
exercidas pelas operadoras. Segundo a categoria, os planos de saúde
impedem a realização de tratamentos de alto custo, abreviam
internações e pressionam os médicos a adotarem medidas de contenção
que ameaçam a eficácia do tratamento dos pacientes.
Não se pode esquecer que, em 2011, a ameaça de greve dos médicos
foi “proibida” pela Secretaria de Defesa Econômica (SDE), ligada ao
Ministério da Justiça, com a manifestação do Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade), no sentido de que os
médicos não poderiam cobrar qualquer valor complementar das
consultas e não poderiam paralisar seus serviços. No entanto, a
classe respondeu com medida judicial no sentido de suspender tal
proibição. Ainda não há julgamento definitivo.
Os médicos se mostram decididos a lutar por seus direitos e por
uma saúde melhor. De forma prudente e organizada, para que a
sociedade não fosse surpreendida com a manifestação em todos os
estados do Brasil, as entidades informaram formalmente o Ministério
da Saúde, o Ministério da Justiça e a ANS acerca do movimento. No
ofício encaminhado às autoridades os médicos ofereceram alguns
números do setor: apontam para o fato de que no Brasil o mercado de
planos de saúde cresce mais de 10% ao ano, o que significa 4
milhões de novos usuários no país por período, o que garante grande
faturamento às operadoras (cuja receita em 2010 foi de R$ 72,7
bilhões), sendo aplicada na assistência médica, de acordo com a
ANS, apenas o montante de R$ 58 bilhões. Restando claro, portanto,
que o setor é lucrativo.
Não é demais apresentar outra justificativa para que os médicos
se mostrem descontentes: nos últimos 11 anos, os índices de
inflação acumulados superaram os 119%. Por outro lado, os reajustes
dos planos somaram 150%, enquanto os honorários médicos no período
não atingiram reajustes de 50%. Os números são ainda mais
surpreendentes se comparados com o desempenho crescente do mercado
de planos de saúde.
O assunto é polêmico, de difícil solução, e ganhou interesse do
Legislativo brasileiro. Por exemplo, tramita no Congresso Nacional
o PLS 380/2011, que em seu texto determina que as mensalidades dos
planos de saúde deverão representar melhoria dos honorários pagos
aos profissionais de saúde credenciados. Este projeto estabelece
ainda que a ANS estipule reajustes regulares para procedimentos e
eventos em saúde cobertos pelas operadoras.
Outro projeto, o PLS 475/2011, é mais amplo e de grande
importância para os pacientes e médicos, uma vez que se refere ao
acréscimo ao artigo 1º. da Lei 9.656/1998, no sentido de se
determinar que as operadoras respeitem a integralidade das ações em
saúde, de acordo com a segmentação contratada, a atenção
multiprofissional e a autonomia e integridade física e moral das
pessoas assistidas. Evidente que a aprovação desse projeto seria o
melhor dos mundos para os usuários e também para os profissionais
da saúde. Porém, o fato é que não basta apenas a alteração da lei —
é essencial a fiscalização do cumprimento das normas. A ANS tem
sido pródiga em criar resoluções que favorecem os beneficiários,
mas as reclamações contra os planos só aumentam.
Assim, não é difícil concluir que a bandeira dos médicos deve
ser também carregada pela população. Não se duvida que a
valorização dos honorários vá incidir em um melhor atendimento
pelos profissionais, que não gostam e não querem atender o paciente
em menos de dez minutos tão somente com o escopo de obter volume de
consultas para que recebam valores razoáveis que paguem suas contas
no final do mês. A suspensão dos serviços ocorrerá nos seguintes
estados: Acre, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Pará,
Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e
Sergipe.
Os médicos advertem: é dever de todos buscar a melhoria nos
atendimentos, cada qual usando seus meios. A saúde, pública ou
privada, é direito de todos!