Mais uma vez, em 2012, os planos de saúde lideraram o ranking de
queixas recebidas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
(Idec).
Segundo o relatório anual do Idec, divulgado em março deste ano,
20% dos atendimentos no ano passado foram relacionados a
reclamações sobre plano de saúde, como negativa de cobertura,
reajustes e descredenciamento de prestadores de serviços. Segundo o
instituto, os planos aparecem no topo da lista pela 11ª
vez.
Diante dos números, é fácil entender porque tantas demandas
relacionadas a planos de saúde chegam ao Superior Tribunal de
Justiça (STJ). Veja o que o Tribunal da Cidadania vêm decidindo
sobre o tema.
Exame negado
Quem paga plano de saúde espera, no mínimo, contar com o serviço
quando precisar. Só que nem sempre isso acontece. Muitas vezes, com
base em argumentos diversos, as empresas negam a
cobertura.
Foi o que se discutiu no julgamento do Recurso Especial (REsp)
1.201.736. A Terceira Turma deu provimento a recurso especial de
uma mulher que teve a realização de exame negado, para restabelecer
a indenização por dano moral de mais de R$ 10 mil fixada em
primeiro grau. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) havia
afastado o dever de indenizar.
Para a Turma, o beneficiário de plano de saúde que tem negada a
realização de exame pela operadora tem direito à indenização por
dano moral. De acordo com a jurisprudência do STJ, o plano de saúde
que se nega a autorizar tratamento a que esteja legal ou
contratualmente obrigado agrava a situação de aflição psicológica
do paciente, fragilizando o seu estado de espírito.
Ação inicial
A paciente ajuizou ação cominatória cumulada com pedido de
indenização por danos morais e materiais contra a Unimed Regional
de Florianópolis Cooperativa de Trabalho Médico. Ela mantinha um
plano de saúde da Unimed, contratado com a Cooperativa do Alto
Vale, e, após ter cumprido o período de carência exigido,
submeteu-se a cirurgia para tirar um tumor da coluna.
Com a rescisão do plano pela Cooperativa do Alto Vale, a
paciente migrou para a Unimed Regional Florianópolis, com a
promessa de que não seria exigida carência. Porém, ao tentar
realizar exames de rotina após a cirurgia, foi impedida sob a
alegação de ausência de cobertura por ainda não ter expirado o
prazo de carência.
O TJSC concedeu antecipação de tutela, autorizando a paciente a
realizar todos os exames e consultas, desde que tivessem origem em
complicações da retirada do tumor da coluna.
Danos morais
O juiz de primeiro grau julgou os pedidos parcialmente
procedentes, obrigando a cooperativa a prestar todos os serviços
contratados sem limitação, e condenou a Unimed ao pagamento de
indenização por dano moral no valor de R$ 10.500,00.
A cooperativa apelou e o TJSC deu provimento parcial para afastar a
condenação por danos morais.
Jurisprudência
A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que
a situação vivida pela autora do recurso foi além do mero dissabor,
e a decisão do tribunal de origem contraria o entendimento
consolidado na Corte Superior. Segundo ela, há sempre alguma
apreensão quando o paciente procura por serviços médicos, ainda que
sem urgência.
A relatora afirmou que mesmo consultas de rotina causam aflição,
pois o paciente está ansioso para saber da sua saúde. No caso
específico, ela avaliou que não havia dúvida de que a situação era
delicada, na medida em que o próprio TJSC reconheceu que os exames
se seguiam à cirurgia realizada pela paciente.
Diante disso, a ministra concluiu que era de pressupor que a
paciente tivesse de fato sofrido abalo psicológico, diante da
incerteza sobre como estaria o seu quadro clínico, sobretudo em
relação a eventual reincidência da doença que a levou a submeter-se
à cirurgia. “Imperiosa, portanto, a reforma do acórdão recorrido,
para restabelecer a condenação por dano moral imposta na sentença”,
afirmou a ministra no voto.
Cirurgia adiada
Outro caso que preocupa os segurados é quando o plano de saúde
adia cirurgia já marcada. Inconformados com a situação, eles acabam
ajuizando ações de indenização para compensar os danos
sofridos.
Ao julgar o REsp 1.289.998, a Terceira Turma reduziu indenização
fixada a paciente que teve negada a cobertura médica por plano de
saude. Para a Turma, a capacidade econômica da vítima precisa ser
levada em conta na fixação da indenização por danos morais, para
evitar enriquecimento sem causa.
A Unimed Palmeira dos Índios (AL) recusou a cobertura para o
paciente, por entender que o valor dos materiais cirúrgicos
cobrados seria excessivo. Pelo comportamento, o Tribunal de Justiça
de Alagoas (TJAL) fixou reparação em dez vezes o valor do material,
somando R$ 46 mil. Daí o recurso ao STJ.
A Terceira Turma afirmou que a indenização deve ser fixada de
modo a compensar prejuízo sofrido pela vítima e desestimular a
repetição da prática lesiva. Para hipóteses similares, o STJ tem
confirmado indenizações entre R$ 10 mil e R$ 32 mil, mas esse valor
deve ser ponderado diante da capacidade financeira da vítima. A
Turma concluiu por fixar a indenização em R$ 20 mil.
Internação domiciliar
Doenças incapacitantes como derrame e infarto severos são
exemplos de algumas das enfermidades que implicam drástica
limitação do indivíduo e acarretam a necessidade de acompanhamento
constante. A ponderação que se faz, no entanto, é se os planos de
saúde e seguradoras estão legalmente obrigados a arcar com os
custos decorrentes do tratamento domiciliar.
Em decisão recente, no Agravo em Recurso Especial (AREsp)
90.117, o ministro Luis Felipe Salomão reconheceu como abusiva a
cláusula restritiva de direito que exclui do plano de saúde o
custeio de serviço de home care (internação domiciliar). “O
paciente consumidor do plano de saúde não pode ser impedido por
cláusula limitativa de receber tratamento com método mais moderno
do que no momento em que instalada a doença coberta pelo contrato”,
acrescentou.
O relator lembrou ainda diversos precedentes do STJ que já vêm
reconhecendo a ilegalidade da recusa das seguradoras em custear
determinados tratamentos indicados para doenças que têm a cobertura
prevista no contrato do plano de saúde.
Descredenciamento
Quem paga plano de saúde quer que a lista de credenciados esteja
sempre atualizada. Mas nem sempre isso acontece. Muitas vezes,
quando precisa do serviço, o beneficiário acaba descobrindo que o
médico ou o hospital foram descredenciados do plano.
Ao julgar o REsp 1.144.840 – interposto pela família de paciente
cardíaco que, ao buscar atendimento de emergência, foi surpreendido
pela informação de que o hospital não era mais credenciado –, o STJ
determinou que as operadoras de plano de saúde têm a obrigação de
informar individualmente a seus segurados o descredenciamento de
médicos e hospitais.
Na ação de indenização, a família narrou que levou o parente a
hospital no qual ele já havia sido atendido anteriormente.
Entretanto, o plano havia descredenciado o hospital sem aviso
prévio individualizado aos segurados. O doente e sua família foram
obrigados a arcar com todas as despesas de internação, que
superaram R$ 14 mil, e ele faleceu quatro dias depois.
Informação completa
Após o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) entender que o
descredenciamento do hospital foi tornado público pela seguradora e
que não era necessário demonstrar a ciência específica do segurado
que faleceu, a família recorreu ao STJ.
Os ministros esclareceram que o recurso não trata do direito das
operadoras de plano de saúde a alterar sua rede conveniada, mas da
forma como a operadora descredenciou o atendimento emergencial do
hospital e o procedimento adotado para comunicar o fato aos
associados.
Observaram no processo que a família recorrente não foi
individualmente informada acerca do descredenciamento. Lembraram
que o Código de Defesa do Consumidor (CDC), no artigo 6º, obriga as
empresas a prestar informações de modo adequado; e o no artigo 46
estabelece que o contrato não obriga o consumidor se ele não tiver
a chance de tomar prévio conhecimento de seu conteúdo.
Por fim, afirmaram que a jurisprudência do STJ assentou que a
informação adequada deve ser “completa, gratuita e útil”, e isso
não ocorreu no caso.
Despesas hospitalares É possivel um plano de saúde fixar no
contrato limite de despesas hospitalares? Para a Quarta Turma, é
abusiva cláusula que limita despesa com internação hospitalar. Para
os ministros, não pode haver limite monetário de cobertura para
essas despesas, da mesma forma como não pode haver limite de tempo
de internação.
A tese foi fixada no julgamento do REsp 735.750, interposto
contra decisão da Justiça paulista, que considerou legal a cláusula
limitativa de custos. Em primeiro e segundo graus, os magistrados
entenderam que não havia abuso porque a cláusula estava apresentada
com clareza e transparência, de forma que o contratante teve pleno
conhecimento da limitação.
Contudo, a Quarta Turma considerou que a cláusula era sim abusiva,
principalmente por estabelecer montante muito reduzido, de R$
6.500, incompatível com o próprio objeto do contrato de plano de
saúde, consideradas as normais expectativas de custo dos serviços
médico-hospitalares. “Esse valor é sabidamente ínfimo quando se
fala em internação em unidade de terapia intensiva (UTI), conforme
ocorreu no caso em exame”, afirmou o relator, ministro Raul
Araújo.
Inadimplência
Uma dúvida comum entre os segurados é se as operadoras de plano
de saúde podem cancelar os contratos por inadimplência. Ao analisar
o REsp 957.900, a Quarta Turma entendeu que as operadoras não
precisam ingressar com ação judicial para cancelar contratos de
consumidores que estejam com mensalidades em atraso há mais de dois
meses. Para os ministros, basta a notificação da empresa aos
inadimplentes, com antecedência, para ela poder rescindir o
contrato.
O caso julgado foi de uma consumidora que entrou com ação contra a
operadora. Ela pretendia anular rescisão unilateral do seu
contrato, determinada pela operadora do palno sob o argumento de
falta de pagamento.
Em primeira instância, o pedido foi negado ao fundamento de que
a consumidora confessou a inadimplência superior a 60 dias. Ela
ainda foi notificada previamente sobre a rescisão por falta de
pagamento, conforme determina o artigo 13 da Lei 9.656/98, que
regulamenta os planos de saúde.
Em apelação, o TJSP restabeleceu o contrato do plano de saúde,
considerando que a notificação não bastaria, sendo necessária a
propositura de ação na Justiça. Inconformada, a operadora entrou
com recurso no STJ.
Lei clara
O relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira, afirmou
que, ao considerar imprescindível a propositura de ação para
rescindir o contrato, o tribunal paulista criou exigência não
prevista em lei.
Em seu artigo 13, parágrafo único, inciso II, a Lei 9.656 proíbe
a suspensão ou rescisão unilateral do plano, “salvo por fraude ou
não pagamento da mensalidade por período superior a 60 dias,
consecutivos ou não, nos últimos 12 meses de vigência do contrato,
desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o
quinquagésimo dia de inadimplência”.
“A lei é clara ao permitir a rescisão unilateral do contrato por
parte da operadora do plano de saúde, desde que fique comprovado o
atraso superior a 60 dias e que seja feita a notificação do
consumidor”, acrescentou o ministro.
Erro médico
Plano de saúde pode responder por erro médico? Ao julgar o REsp
866.371, o STJ decidiu que as operadoras de plano de saúde
respondem solidariamente com médicos no pagamento de indenização às
vítimas de erros ocorridos em procedimentos médicos.
O entendimento, já manisfestado em diversos julgados da Corte,
foi reafirmado pelos ministros da Quarta Turma ao dar provimento ao
recurso especial para reconhecer a responsabilidade da Unimed Porto
Alegre Cooperativa de Trabalho Médico e aumentar de R$ 6 mil para
R$ 15 mil o valor da indenização por danos morais para cliente que
teve vários problemas após cirurgia de retirada de cistos no
ovário.
A questão teve início quando a cliente foi à Justiça pedir
reparação por danos morais e estéticos, em ação contra a médica, o
hospital e a Unimed, em virtude de erro médico. Em primeira
instância, a ação foi julgada improcedente. O juiz considerou as
provas periciais inconclusivas. Insatisfeita, a paciente
apelou.
Só a médica
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) decidiu, no
entanto, que o hospital e a Unimed não poderiam ser
responsabilizados pelo erro cometido pela médica. Segundo entendeu
o tribunal gaúcho, a médica não era empregada do hospital e não foi
indicada à paciente pela operadora do plano de saúde, embora fosse
credenciada como cooperada. Condenou, então, apenas a médica,
concluindo que estava caracterizada sua culpa. A indenização foi
fixada em R$ 6 mil por danos morais.
No recurso para o STJ, a paciente não contestou a exclusão do
hospital. Apenas sustentou a responsabilidade da Unimed e pediu
aumento do valor fixado pela primeira instância. A médica também
recorreu, mas seu recurso não foi admitido.
O relator, ministro Raul Araújo, observou inicialmente a
distinção entre os contratos de seguro-saúde e dos planos de saúde.
“No seguro-saúde há, em regra, livre escolha pelo segurado dos
médicos e hospitais e reembolso pela seguradora dos preços dos
serviços prestados por terceiros”, explicou. “Nos planos de saúde,
a própria operadora assume, por meio dos profissionais e dos
recursos hospitalares e laboratoriais próprios ou credenciados, a
obrigação de prestar os serviços”, acrescentou.
Responsabilidade objetiva
Para o relator, não há dúvida de que a operadora do plano de
saúde, na condição de fornecedora de serviço, deve responder
perante o consumidor pelos defeitos em sua prestação. “Seja quando
os fornece por meio de hospital próprio e médicos contratados ou
por meio de médicos e hospitais credenciados, nos termos dos
artigos 2º, 3º, 14 e 34 do Código de Defesa do Consumidor”, disse
ele.
O ministro lembrou que essa responsabilidade é objetiva e
solidária em relação ao consumidor. “Na relação interna, respondem
médico, hospital e operadora do plano de saúde nos limites da sua
culpa. Cabe, inclusive, ação regressiva da operadora contra o
médico ou hospital que, por culpa, for o causador do evento
danoso”, afirmou o ministro.
Além de reconhecer a solidariedade entre a Unimed e a médica para a
indenização, o ministro votou, também, pelo aumento do valor a ser
pago. A reparação por danos morais foi fixada em R$ 15 mil, mais
correção monetária, a partir da data do julgamento na Quarta Turma,
e juros moratórios de 0,5% ao mês até a entrada em vigor do Código
Civil de 2002, e de 1% a partir de então, computados desde a
citação.