Principal prioridade dos brasileiros segundo
pesquisa Datafolha,
a saúde não ocupa lugar central nos planos de governo
dos candidatos à
Presidência. Apesar de haver consenso sobre a importância
da assistência
pública, o excesso de generalizações nas propostas denota
compromissos limitados.
A avaliação é de especialistas ligados
à Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) que elaboraram
documento após análise dos planos dos presidenciáveis para a saúde
registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
"São propostas não concretas,
intenções vagas, o que torna muito difícil controlar [o
cumprimento] depois", afirma Ligia Bahia, professora de saúde
coletiva da UFRJ (Universidade Federal do RJ), uma das autoras da
análise.
Maior sistema de saúde gratuito do
mundo, atendendo a quase 75% da população do país, o SUS sofre de
um crônico subfinanciamento,
que pode piorar nos próximos anos.
Do total, sete candidatos são a favor
de aumentar recursos para a saúde, mas só três trazem metas
específicas para esse aumento, e ainda assim não detalham como vão
conseguir isso em um cenário de crise econômica e ajuste
fiscal.
Fernando Haddad (PT), Guilherme Boulos
(PSOL) e Ciro Gomes (PDT), por exemplo, prometem revogar a emenda
constitucional que estipulou o teto de gastos e que congela o
orçamento da saúde por 20 anos, como forma de aumentar os recursos
para o setor.
Já Henrique Meirelles (MDB) defende a
emenda e, ao mesmo tempo, diz que vai ampliar os recursos à saúde.
Marina afirma que reverterá a tendência de retração do Orçamento
federal, mas não detalha como. Alckmin não promete mais recursos no
programa, mas à Folha disse que o fará. "O
fato de falar que vão aumentar [o financiamento] também não diz
muita coisa porque tudo é muito genérico", diz Mario Scheffer,
professor de saúde preventiva da USP e outro autor da
análise. João Amoêdo (Novo) e Jair Bolsonaro (PSL), por outro
lado, consideram que os gastos com saúde são excessivos.
Segundo os autores do documento,
Bolsonaro fundamenta seu diagnóstico em dados mal interpretados de
um gráfico comparativo de países desatualizado e sem legenda.
Procurada, a campanha do candidato não respondeu à reportagem.
Amoêdo parece incoerente ao dizer que
"gasta-se muito, mas gasta-se mal" e, ao mesmo tempo, apontar que
os recursos são limitados para responder à combinação de doenças
infecciosas, crônicas e causas externas, como violência e
acidentes, com o rápido envelhecimento da população.
Os candidatos se inspiram em estudo do
Banco Mundial que aponta que, nos próximos 12 anos, o SUS poderia
economizar R$ 115 bilhões se buscasse mais eficiência na rede.
Para Francisco Funcia, diretor da
Abres (Associação Brasileira de Economia da Saúde), vários
candidatos têm analisado esse estudo de forma errada. "Ele fez
análise para apurar o valor da ineficiência. Não quer dizer que
pode pegar esse valor e tirar recurso do sistema", diz. "Nosso
sistema público é subfinanciado. Isso não quer dizer que não
precisa aprimorar o sistema ou a gestão."
Em um sinal de consenso, sete
candidatos propõem ampliação dos serviços da atenção básica --mas
em diferentes níveis ou formatos ou integração com
as redes de especialistas. Também não mencionam custo e em qual
patamar ocorrerá essa expansão. “A ampliação tem custo. Há
incompatibilidade entre as sugestões de expansão [da rede] e a não
previsão de mais financiamento”, diz Scheffer.
Os programas de Alckmin, Álvaro
Dias e João Amoêdo sugerem que as expansões de redes de serviços
possam ocorrer com melhor gestão e combate à corrupção. Atendimento
especializado e reforço nas redes de urgência e emergência constam
das plataformas de Haddad, Ciro Gomes e Marina. Já os hospitais
públicos não foram objeto de propostas dos candidatos.
“Nenhum propõe o que fazer com o
gargalo das cirurgias eletivas e a penúria dos hospitais públicos,
especialmente os federais. Em compensação, a solução mágica do
prontuário eletrônico aparece em quase todos”, afirma Ligia.
Promessa que aparece há anos nas
propostas dos candidatos, o prontuário eletrônico universal, além
de caro, é de difícil implantação por causa da fragmentação da rede
assistencial no Brasil. “É muito precária a comunicação entre as
unidades básicas, a rede de especialistas e os hospitais”, explica
Scheffer.
Em São Paulo, por exemplo, há unidades
de saúde com dois serviços —Assistência Médica e Ambulatorial (AMA)
e Estratégia Saúde da Família, com dois gestores (administração
direta e organização social), atendendo aos mesmos pacientes e sem
integração dos dados.
Em outro ponto da análise das
propostas, especialistas ressaltam a ausência de compromissos com a
redução das disparidades regionais em saúde e de propostas
relativas à qualidade dos serviços.
PROPOSTAS
DOS PRESIDENCIÁVEIS PARA A SAÚDE
Financiamento
Álvaro
Dias (Podemos)
Não menciona
Ciro
Gomes (PDT) Revogar a Lei do Teto de Gastos e redução
inicial de 15% das desonerações fiscais e tributárias
Fernando
Haddad (PT) Revogar a Lei do Teto de Gastos; aumentar o
investimento público em saúde para 6% do PIB; novas regras fiscais,
reforma tributária, retorno do Fundo Social do Pré-Sal
Geraldo
Alckmin (PSDB) Não menciona
Guilherme
Boulos (PSOL) Revogar a Lei do Teto de Gastos;
aumentar o financiamento federal na saúde de 1,7% para 3% do PIB;
reverter a renúncia tributária com planos de saúde
Henrique
Meirelles (MDB) Ampliar a participação do governo
federal no financiamento da saúde
Jair
Bolsonaro (PSL) Não menciona, cita “fazer mais com os
atuais recursos”
João Amoêdo (Novo) Não menciona, cita necessidade de melhorar
eficiência
Marina
Silva (Rede) Reverter a tendência de retração do
orçamento federal para saúde
Problemas - Não há detalhes de
onde virão os recursos para aumentar o financiamento em saúde e de
como seriam as eventuais reformas tributárias e fiscais
Organização da rede
assistencial
Álvaro
Dias (Podemos)
Fila zero nas emergências; consórcios intermunicipais
Ciro
Gomes (PDT) Ampliação da atenção primária e de
policlínicas, reforço das emergências, integração entre a atenção
básica, hospitalar e emergencial
Fernando
Haddad (PT) Atenção básica resolutiva e organizadora do
cuidado à saúde; criar rede de especialidades multiprofissional
Geraldo
Alckmin (PSDB) Ampliar o Programa Saúde da Família e
incorporar a ele mais especialidades
Guilherme
Boulos (PSOL) Expansão da atenção básica; ampliação de
leitos hospitalares e acesso a medicamentos
Henrique
Meirelles (MDB) Ampliar a atenção básica e coordenação
das redes de atenção à saúde; recuperação financeira dos hospitais
filantrópicos; incentivos e planos de carreira
Jair
Bolsonaro (PSL) Credenciamento universal de médicos;
carreira de médico de Estado
João
Amoêdo (Novo) Aprimoramento da gestão da saúde pública;
expansão e priorização dos programas de prevenção e “clínicas de
família”
Marina
Silva (Rede) Ampliar a cobertura da atenção básica;
dividir país em 400 regiões de saúde
Problemas - Fala-se em ampliação da
atenção primária e das redes de especialidades, mas não há
detalhamento do volume nem de onde sairão os recursos