De acordo com uma matéria veiculada no Valor neste domingo (10), uma nova lei vai trazer mudanças relevantes para o seguro garantia no Brasil. A nova “Lei das Licitações”, aprovada no Senado Federal em dezembro, permitirá uma cobertura de até 30% do valor do projeto em caso de não execução de uma obra municipal, estadual ou federal a partir de R$ 200 milhões. Antes, o percentual era de até 10%. Por outro lado, as seguradoras passarão a ter mais responsabilidades, e deverão acompanhar o projeto do início ao fim.
Inclusive, as empresas deverão avaliar a viabilidade técnica dos projetos e para isso algumas já estão montando suas áreas de engenharia. As mudanças, segundo especialistas ouvidos pelo Valor, reduzem incertezas sobre a execução de obras e aumentam a capacidade do Brasil de atrair investimento estrangeiro. A lei ainda precisa ser sancionada pelo pelo presidente.
Até o momento, se o governo quisesse contratar uma obra, o processo era considerado como tendo uma análise de risco superficial. A empresa que quisesse participar de uma licitação contratava um seguro garantia, que iria cobrir no máximo 10% do valor da obra em caso de não execução. A seguradora, por sua vez, não acompanhava o processo e se surgisse algum problema ou mudanças entre as partes, não era informada. “A seguradora funcionava como um cartório e tinha que ter uma situação muito específica para ter um sinistro”, afirma o presidente da BMG Seguros, Jorge Sant’Anna.
Para o executivo, a nova lei “faz com que a seguradora esteja no risco de fato”, segundo o executivo. O projeto a ser licitado terá que ter avaliação de viabilidade técnica e a empresa de seguros precisará analisar até mesmo a idoneidade do licitante e do licitado. “Na minha avaliação, passará a atuar como um auxiliar da regulação”, disse Sant’Anna. A empresa terá livre acesso para acompanhar e fazer auditoria na obra. E se perceber que há algum desvio e for complacente, poderá ser legalmente envolvida no processo.
Desde os anos 90 tramitando, a nova lei era aguardada com muita expectativa, que desejava que a cobertura do seguro pudesse chegar até a 100% do valor da obra, mesmo que fosse de forma gradual. “Uma cobertura de 30% não oferece 100% de segurança. Já tivemos um avanço, mas acho que ainda poderíamos avançar mais”, disse o presidente da seguradora Pottencial, João Géo Neto. A Pottencial está estruturando sua área de engenharia para acompanhar as obras, segundo ele. “Teremos que ficar muito mais próximo das empresas.” Neto espera um aumento da demanda, ao mesmo tempo que vê um pouco mais de segurança para o governo.
Apesar de haver algum receio de que as novas regras possam trazer maior complexidade técnica, as seguradoras estão preparadas, na visão do advogado Cássio Amaral, sócio do escritório Mattos Filho. “Teremos obviamente um custo maior, mas as seguradoras estão capitalizadas para criar a estrutura necessária. Será exigido um compromisso maior da seguradora, que passará a oferecer um serviço acoplado ao seguro, que antes era visto como um patinho feio”, disse. A seguradora vai entrar como mais um filtro de eficiência, que irá ajudar a monitorar a execução do contrato, acrescentou.
Com as mudanças previstas, aumenta a necessidade de resseguro. “Neste momento, falar de aumento de capacidade é complicado. Os resseguradores estão receosos no mundo todo por conta da pandemia. Obras de grandes vultos são significativas. Pensando em todo o histórico do Brasil, é compreensível os resseguradores ficarem com um pé atrás”, afirmou Marcelo Mencaroni, vice-presidente comercial da THB Brasil, especializada em gestão de riscos, consultoria de benefícios e corretagem de seguros e resseguros. Com o tempo, na visão do executivo, o mercado tende a se adaptar e as mudanças resultarão em maior transparência e controle das obras.