A questão a ser tratada no presente artigo é o aumento do valor do plano de saúde para pessoas com ou acima de 60 anos de idade. Discute-se a legalidade do reajuste aos idosos que são consumidores de plano de saúde – ressaltando que esses consumidores são protegidos pelo Estatuto do Idoso (lei 10.741 de 2003), pela lei 9.656 de 1998 (lei dos planos de saúde) e pelo Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078 de 1990).
É sabido que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) limitou em 9,04% o índice de reajuste para os planos de saúde médico-hospitalares individuais/familiares. O percentual, aprovado pelo Ministério da Fazenda, é o teto válido para o período entre maio/2013 e abril/2014.
Tendo em vista a competência da ANS para limitar índices de reajustes para planos de saúde individuais e familiares, diversos beneficiários de planos de saúde coletivos movem na justiça ações contra os reajustes aplicáveis por suas operadoras, que por vezes ultrapassam 500% do valor pago mensalmente.
Porém, percebe-se pela análise das leis a respeito do tema que os reajustes diferenciados para os maiores de sessenta anos, por mudança de faixa etária, passaram a ser vedados pelo art. 15, parágrafo único, da lei 9.656/98, que assim estabelece:
“Art. 15 – A variação das contraprestações pecuniárias estabelecidas nos contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § lº do art. 1º desta Lei, em razão da idade do consumidor, somente poderá ocorrer caso estejam previstas no contrato inicial as faixas etárias e os percentuais de reajustes incidentes em cada uma delas, conforme normas expedidas pela ANS, ressalvado o disposto no art. 35-E. Parágrafo único. É vedada a variação a que alude o caput para consumidores com mais de sessenta anos de idade, que participarem dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º, ou sucessores, há mais de dez anos.” (os grifos não são do original).
E a mesma proteção também se encontra no Estatuto do Idoso, disposta no art. 15, § 3º: “Art. 15 – É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos. … § 3º – É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade.” (grifamos)
Dessa forma, observando o texto contido nessas duas leis específicas, percebe-se que os aumentos abusivos das mensalidades dos planos de saúde a maiores de 60 anos não podem prevalecer – mesmo nos contratos coletivos, pois desrespeitam o disposto no artigo 15, § 3º, da Lei n° 10.741/03, e também o artigo 15, parágrafo único, da Lei n° 9.656/98, que vedam o reajuste do plano em razão da mudança de idade aos segurados com mais de 60 anos de idade.
O judiciário, por sua vez, também tem se mostrado contra o aumento abusivo das operadoras e seguradoras do ramo de saúde para idosos. E, solucionando o impasse do “quanto aumentar?” os juízes decidem por equilibrar o reajuste dos planos coletivos aos índices praticados pela ANS.
Isso quer dizer que atualmente os idosos consumidores de plano de saúde coletivos podem questionar judicialmente a validade dos porcentuais impostos pelos seus convênios médicos, requerendo que o aumento seja limitado ao autorizado pela ANS.
Ainda, além de conseguirem na justiça a declaração de nulidade do aumento, os consumidores idosos podem conseguir a devolução dos valores que pagaram em abusividade pelos últimos 10 anos.
Isto é, um consumidor com 70 anos de idade que teve seu plano de saúde coletivo aumentado desde quando tinha 60 anos, pode pleitear na justiça a diferença que pagou acima dos limites fixados pela ANS, pelos últimos 10 anos.
A Lei 9.656/98, impõe que o contrato contenha dispositivo que indique com clareza os critérios de reajuste e revisão das contraprestações pecuniárias (art. 16, XI). Se assim não for, o aumento é considerado abusivo pelo poder judiciário.
O entendimento consolidado do Tribunal paulista é expresso por meio da Súmula nº 91 e 100, respectivamente:
“Ainda que a avença tenha sido firmada antes da sua vigência, é descabido, nos termos do disposto no art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, o reajuste da mensalidade de plano de saúde por mudança de faixa etária”.
“O contrato de plano/seguro saúde submete-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor e da Lei nº 9.656/98 ainda que a avença tenha sido celebrada antes da vigência desses diplomas legais.”
Além das súmulas acima transcritas, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou contrário ao aumento da mensalidade do plano de saúde ao idoso sob argumento de “alta de sinistralidade”, conforme decisão abaixo:
“DIREITO DO CONSUMIDOR. ESTATUTO DO IDOSO. PLANOS DE SAÚDE. RESCISÃO DE PLANO DE SAÚDE EM RAZÃO DA ALTA SINISTRALIDADE DO CONTRATO, CARACTERIZADA PELA IDADE AVANÇADA DOS SEGURADOS. VEDAÇÃO. 1. Nos contratos de seguro em grupo, o estipulante é mandatário dos segurados, sendo parte ilegítima para figurar no pólo passivo da ação de cobrança. Precedentes. 2. Veda-se a discriminação do idoso em razão da idade, nos termos do art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, o que impede especificamente o reajuste das mensalidades dos planos de saúde sob alegação de alta sinistralidade do grupo, decorrente da maior concentração dos segurados nas faixas etárias mais avançadas; essa vedação não envolve, todavia, os demais reajustes permitidos em lei, os quais ficam garantidos às empresas prestadoras de planos de saúde, sempre ressalvada a abusividade. 3. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1106557/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/09/2010, DJe 21/10/2010)” (grifamos)
Ressalta a Ministra que o argumento das operadoras de plano de saúde no sentido de que a elevação do valor da mensalidade se dá por aumento de sinistralidade do grupo é também uma forma de discriminar o idoso, o que é vedado por lei, como visto acima.
Esse avanço na proteção do consumidor idoso é relativamente novo, por esse motivo é que foi pouco divulgado até o momento.
Portanto, é necessário levar ao conhecimento dos consumidores e dos corretores de seguros que já existem maneiras judiciais para preservar e garantir o direito do idoso face aos aumentos abusivos dos planos de saúde e, ainda, caso tenham sido vítimas dos aumentos abusivos, poderão ser ressarcidos dos valores pagos.
Por fim, vale esclarecer que até mesmo a elevação do valor da mensalidade nas proximidades do beneficiário completar 60 anos (ou seja, com 58/59 anos de idade) tem sido repudiada pelo nosso Tribunal de Justiça, assim se você é uma vítima desse aumento abrupto, procure respaldo judicial, pois o aumento poderá ser considerado abusivo.
Felipe Galesco
Galesco Advogados Associados
Felipe Galesco é advogado, sócio do escritório Galesco Advogados Associados, especialista (pós graduação lato sensu) em Direito Processual Civil pela PUC/SP, especialista (MBA) em Direito do Seguro e Resseguro pela Escola Superior Nacional de Seguros, membro do Grupo Nacional de Trabalho das Relações de Consumo da Associação Internacional de Direito Securitário – AIDA, é palestrante e professor de direito securitário no curso de extensão universitária da FMU/SP.