Centro de
Reabilitação Cardíaca do Instituto Nacional de Infectologia Evandro
Chagas aposta na manutenção da atividade física de portadores de
Chagas e outras doenças
Perto
de completar seu primeiro aniversário, em 24 de abril, o Centro de
Reabilitação Cardíaca do Instituto Nacional de Infectologia Evandro
Chagas (INI/Ipec) faz um balanço das atividades. O projeto estimula
socialização e independência física de pacientes com insuficiência
cardíaca ocasionada pela doença de Chagas e síndrome metabólica
devido ao tratamento de HIV/Aids. Não fossem os aparelhos de
aferição cardíaca e consultórios, o cenário lembra uma academia de
ginástica comum: esteira, bicicleta, supino, pesinhos, espelho. O
Centro de Reabilitação Cardíaca chega ao seu primeiro ano como um
projeto inovador no setor público de saúde, atendendo a uma das
recomendações das diretrizes de tratamento em cardiologia: a
manutenção do paciente com atividade física regular, supervisionada
e orientada.
O
programa, que atende pacientes do instituto com insuficiência
cardíaca ocasionada por doença de Chagas e síndrome metabólica ou
cardiopatia decorrente do tratamento para HIV/Aids, integra
avaliação e acompanhamento de uma equipe multidisciplinar na
supervisão de exercícios individualizados. Além das atividades
físicas, o paciente recebe o apoio de profissionais das áreas de
Nutrição, Farmácia e Serviço Social.
“Fazemos o acompanhamento clínico nas três vezes
por semana em que o paciente vem, e assim, além da melhora da
capacidade funcional, que é o nosso objetivo, conseguimos
identificar precocemente fatores de descompensação”, diz a médica
Fernanda Sardinha. “Acredito que a grande oportunidade que
apresentamos com a reabilitação cardíaca seja a melhora da aptidão
física do paciente em relação ao condicionamento físico, força e
flexibilidade”, informa a educadora física Vivian
Mattos.
De
acordo com Vivian, o condicionamento físico é otimizado com
treinamento aeróbico. “A força e a flexibilidade são variáveis
importantes, uma vez que temos alguns pacientes idosos e eles
apresentam riscos de queda maior. A partir do momento em que
melhoramos essa parte, também elevamos a qualidade de vida e
autoestima, ao promover a independência nas atividades do dia a
dia, como varrer a casa ou ir ao supermercado”.
Além
das consultas e atividades físicas, o centro também tem a
responsabilidade de acompanhar o tratamento farmacológico de seus
usuários. “Conseguimos identificar, junto com a equipe, os
pacientes que têm mais dificuldade cognitiva para conseguir cumprir
seu tratamento”, explica o farmacêutico Gilberto Marcelo Sperandio.
“Temos a oportunidade de ajudar o paciente com uma prática que
ainda é pouco comum no Brasil, a atenção farmacêutica.
Identificamos possíveis eventos adversos e podemos contribuir para
o aumento da adesão ao tratamento”.
O
projeto também tem colaborado na socialização desses pacientes.
“Muitos pensam que são os únicos na gravidade de sua doença, mas
encontram aqui pessoas com o mesmo problema. Isso faz com que eles
se ajudem mutuamente no tratamento”, afirma a médica e pesquisadora
Andrea Silvestre. “Tão importante quanto o benefício
cardiovascular, é a melhora na qualidade de vida desses pacientes”.
O Serviço Social também participa desse processo, ao conferir a
frequência dos usuários e possíveis problemas que eles possam
enfrentar para comparecer às consultas e treinos.
Paciente do INI/Ipec em tratamento para doença de
Chagas, a dona de casa Maria Fonseca dos Santos está no projeto
desde o início: “Cheguei aqui cheia de dores, mas o (programa de)
exercício funcionou. Me sinto mais disposta”, afirma, destacando a
integração com outros pacientes. “Formamos uma família”.
“Estou sentindo mais disposição. Em casa, ficamos
curtindo a preguiça, mas aqui reagimos. Todos aqui nos tratam muito
bem, com profissionalismo. Estou gostando muito”, conta o gesseiro
João das Neves, o único paciente transplantado do
programa.
Educador físico, Mauro Mediano destaca a
multidisciplinaridade e o ineditismo do programa. “É um projeto
inovador, em se tratando de doença de Chagas. Não existe nenhum
projeto ou tratamento multidisciplinar para esse público. A
resposta que temos no dia a dia é muito significativa. Percebemos
que a socialização, o momento de estar entre os pares deles, de
trocar informações sobre o tratamento, os medos sobre a própria
doença, é fundamental. Conseguimos contribuir para a saúde e
bem-estar desses indivíduos”.
Funcionamento
O paciente tem direito a um período
de 3 a 6 meses em treinamento com exercício no espaço. Na admissão,
ele passa por uma avaliação detalhada, que inclui avaliação
nutricional, exames laboratoriais e ecocardiograma. “Além das
atividades físicas, ele também recebe o apoio de toda a equipe –
que conta com profissionais das áreas de Nutrição, Farmácia e
Serviço Social – para melhorar a aderência ao tratamento e
controlar os fatores de risco, como o sobrepeso”, comenta
Andrea.
Outro
foco de atenção do projeto são os pacientes HIV reativos. As novas
terapias antirretrovirais aumentam a sobrevida e a possibilidade de
complicações não relacionas diretamente ao HIV. “Antes, cerca de
15% dos pacientes que faleciam de causas não relacionadas ao HIV.
Hoje, mais de 40% vão a óbito por causas não relacionadas, e as
doenças cardiovasculares são as principais responsáveis. Grande
parte dessas complicações estão relacionadas ao próprio tratamento
de controle do vírus”.
Para
utilizar o espaço, os pacientes devem comparecer ao local pelo
menos três vezes na semana. A pesquisadora afirma que um dos
maiores desafios do projeto é sensibilizar o paciente para a
importância do exercício. “As pessoas colocam empecilhos em relação
ao trabalho, disponibilidade de tempo, de dinheiro. O Serviço
Social está presente, porque temos que garantir que o paciente e
sua família (ou o empregador, caso ele tenha vínculo empregatício)
entendam que isso é fundamental, porque você vai melhorar sua
qualidade de vida e aumentar a sobrevida”, diz. “Isso faz parte do
tratamento. Muitas vezes, o paciente não consegue esse benefício
nem em rede privada”.
A
missão do programa é reabilitar e promover a saúde cardiovascular
através de uma mudança no estilo de vida com intuito de que o
paciente seja capaz de manter suas atividades após a alta do
programa. “O mundo ocidental hoje sofre com isso: as pessoas se
alimentam cada vez pior, fazem menos atividades físicas e tendem a
desenvolver obesidade, hipertensão. Temos um número grande de
pacientes que podem se beneficiar com esse projeto”