Problemas são especialmente altos em mulheres, desempregados, em pessoas com baixa escolaridade e com baixa renda
Em artigo publicado na última edição da revista Cadernos de Saúde Pública, pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), em parceria com outras instituições*, investigaram a taxa de transtornos mentais comuns (como depressão e ansiedade) e suas associações com características sociodemográficas apresentadas na atenção primária de 27 unidades de saúde da família de quatro capitais brasileiras. Os resultados apontaram taxas maiores que 50% nas cidades analisadas: 51,9% no Rio de Janeiro, 53,3% em São Paulo, 64,3% em Fortaleza e 57,7% em Porto Alegre. A análise também indicou que os problemas de saúde mental são especialmente altos em mulheres, desempregados, em pessoas com baixa escolaridade e com baixa renda.
Segundo os estudiosos, pesquisas que estimam a prevalência de transtornos mentais na atenção primária são pouco comuns no Brasil, sendo a maioria referentes a cidades com menos de 650 mil habitantes. Para ajudar a preencher a lacuna, o estudo contou com a participação de cerca de 1,8 mil pacientes das unidades de saúde avaliadas. “Há muitas razões que podem explicar a alta prevalência de transtornos de ansiedade no Brasil, como a violência urbana generalizada e as condições socioeconômicas adversas. Sabe-se que uma das principais causas de mortalidade e morbidade no Brasil é a violência. Além disso, a poluição, os altos níveis de ruído e a falta de áreas recreativas nas grandes cidades brasileiras pode estar relacionadas com os níveis de ansiedade”, explicam os pesquisadores no artigo.
As altas taxas encontradas demonstram, para os pesquisadores, a necessidade de discutir melhor o atendimento oferecido a população brasileira, impactando o planejamento de políticas de saúde mental. “Primeiramente, é importante não enxergarmos os transtornos mentais comuns como diagnósticos categóricos, mas como possíveis fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbios mais graves”, destacam os pesquisadores. Eles ainda acrescentam que as equipes da saúde da família devem estar cientes da extensão dos problemas psicossociais, a fim de optar por uma abordagem mais integrada nos cuidados com a saúde do paciente. Programas de treinamento e educação para profissionais de cuidados primários precisariam ser introduzidos, juntamente com melhorias nos serviços de suporte. “Estratégias de educação devem envolver competências adicionais que vão além do simples ato de diagnosticar e da gestão de medicamentos no caso de distúrbios de saúde mental comuns”.
Os pesquisadores finalizam o artigo chamando atenção para a necessidade de políticas públicas que acarretem em melhorias para a saúde mental de uma forma geral. “Os decisores políticos devem realizar esforços para reduzir as desigualdades econômicas e implementar políticas de educação e de segurança pública a fim de superar o círculo vicioso da pobreza, da violência urbana e de transtornos mentais, atuando diretamente para a promoção bem-estar humano”, concluem.
*Participaram também do estudo pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo, da Universidade de Manchester e da Universidade de Liverpool (ambas do Reino Unido), da Universidade Estadual de Campinas, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.