Com base na experiência da Zênite Assessoria e Consultoria em mais de 200 sinistros no seguro de Responsabilidade Civil de profissionais e estabelecimentos de saúde, o sócio-diretor da empresa, Felippe Paes Barretto, compilou alguns dados que fornecem uma ideia da exposição de risco desse segmento. Desse volume de sinistros, ele observou que 61% envolviam hospitais, 23% laboratórios, 7% clínicas de saúde, 6% operadoras de saúde e 3% assistências odontológicas. Entre as operadoras de saúde, um dado que lhe chamou atenção é que todas, sem exceção, enfrentaram algum tipo de ação na justiça, especialmente em função da solidariedade com sua rede credenciada.
Já em sinistros envolvendo os profissionais de saúde, a Zênite apurou que a especialidade campeã em ações na justiça é a cirurgia plástica, seguida pela ginecologia e obstetrícia e pela traumatologia. De acordo com Barretto, a soma de valores pleiteados na justiça em ações envolvendo essas especialidades já atingiu R$ 81 milhões, caindo para cerca de R$ 20 milhões nos casos em que houve condenação. “Mesmo assim, é um valor significativo”, comentou.
A partir dessa experiência, Barretto concluiu que chegou o momento de o setor de seguros se unir para conhecer melhor os segurados desse ramo. “Assim evitaremos que os técnicos das seguradoras recusem os riscos de saúde, frequentemente, ou aceitem sem conhecimento pleno”, disse. Ele afirma que foi esse o motivo que o levou a organizar um Debate do Meio-Dia na APTS, dia 16 de março, no auditório da Funenseg, em São Paulo, intitulado “Responsabilidade Civil do Profissional e dos Estabelecimentos de Saúde – A subscrição do risco e as peculiaridades do setor”.
A apresentação do tema ficou à cargo da analista de risco da Zênite, Bruna Malagoli, que é especialista em Gestão de Qualidade em Saúde e Acreditação. Como debatedores, participaram Misael de Lima, da Nobre Seguradora, e René Ramos Leitão, da Tokio Marine. O presidente do CVG-SP, Osmar Bertacini, foi uma das autoridades que prestigiaram o evento.
Análise de risco
Nos últimos dez anos, as empresas de saúde passaram a se preocupar mais com os seus riscos. Mas, segundo Bruna Malagoli, somente há cerca de cinco anos é que começaram a entender a necessidade de adotar o gerenciamento de riscos. Ela reconhece que a área é bastante complexa e muito regulada, a ponto de existirem pelo menos 50 legislações envolvendo hospitais, clínicas e centros cirúrgicos. “Imagine o quanto precisamos conhecer para poder analisar o risco e entender quais os agravos podem acontecer no futuro, caso aceitemos ou não essa instituição”, disse a analista de risco.
Em sua apresentação, Bruna dividiu a análise de risco em instituições de saúde em duas partes. A primeira, feita à distância, começa pela composição do perfil da instituição e envolve, primeiramente, a definição da área de atuação e a complexidade do serviço. “É preciso saber, por exemplo, se a instituição é uma clínica ambulatorial ou centro cirúrgico de alta complexidade. No caso de médicos, se atendem em consultórios ou em hospitais que possuem, por exemplo, emergências de unidades coronarianas”, explicou.
A razão social dos sócios é importante conhecer, segundo ela, para se investigar o passado da empresa antes de efetuar o contrato de seguro. O número de leitos é outra informação que revela o porte da empresa, assim como o número de pacientes. A relação de ambos os dados, de acordo com Bruna, resulta na taxa de ocupação do hospital, cuja média não deve ultrapassar 85%. “Não se pode aceitar o risco de um hospital que esteja no limite de sua ocupação”, orientou. A localização geográfica da instituição de saúde pode parecer uma informação irrelevante, mas não é, segundo a especialista. Ela citou o caso de um famoso hospital localizado próximo de regiões pobres, que constantemente se vê obrigado a prestar socorro aos moradores da vizinhança.
Outro dado importante é o histórico de sinistros da empresa. Com essas informações, o subscritor pode concluir que do volume de sinistros, a maioria se refere a um único médico, por exemplo, o que facilita o trabalho de gerenciamento, ou então que a maioria ocorreu no centro cirúrgico. “Nesse caso, basta estabelecer um contrato que exclua o centro cirúrgico da cobertura”, ensina Bruna. Indicadores e estatísticas podem revelar, ainda, segundo ela, se a empresa está bem gerenciada, caso o índice de infecção hospitalar, por exemplo, seja baixo.
Concluído o perfil da instituição, então é o momento de verificar in loco se as informações transmitidas são verdadeiras. “Ir ao local do risco faz toda a diferença”, garante. Aos subscritores, ela orienta que se munam de um check list para verificar se todas as exigências da lei e dos órgãos reguladores são cumpridas pelo estabelecimento. Por fim, um relatório contendo os fatores potenciais de risco e a conclusão da inspeção deverão indicar a aceitação ou a recusa do risco.
Fatores de riscos
De acordo com Bruna, os fatores de risco em estabelecimentos de saúde estão divididos em três classes: falha humana, falha material e falha organizacional. A falha humana pode ser configurada pela coleta insatisfatória de material, por exemplo, ou por contaminação. Casos como esses ocorrem porque o profissional não tem habilidade técnica para o serviço ou por cansaço, devido ao excesso de carga horária. A falha material está relacionada, geralmente, ao uso de material vencido ou de procedência duvidosa, ou, ainda, por equipamentos velhos e sem manutenção.
A falha organizacional é um pouco mais complexa, sobretudo por conta das inúmeras legislações que regulam a atuação dos estabelecimentos. “Existem resoluções enormes e detalhadas, difíceis de serem cumpridas integralmente. Mas é importante saber o quanto da legislação o hospital está cumprindo”, ensinou. Outra falha nessa área envolve o dimensionamento errado do quadro de pessoal, nos casos em que o número de profissionais é insuficiente ou mal aproveitado. Essa lista inclui, ainda, os prontuários malfeitos e a guarda inadequada de documentos.
Ferramentas
Bruna concluiu sua apresentação, explicando que existem ferramentas que podem orientar as empresas de saúde a gerenciarem o seu risco. Esse é o caso das boas práticas emitidas pela Organização Nacional de Acreditação (ONA), na qual ela atua, e também das resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM). “Temos um mercado grande, mas precisamos saber quais os riscos trabalhar, como analisá-los e qual o resultado que essa parceria com a instituição de saúde pode trazer. Se positivo ou negativo”, concluiu.
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