Uma escolha difícil mas, para eles, necessária. Aliviar o orçamento da família cortando o plano de saúde.
"Plano de saúde não vale a pena. É um absurdo. Principalmente por causa da idade, né? Eu tenho mais de 60, então já viu..."
"Eu tinha o convênio da empresa. Hoje, a gente não tem aqui por enquanto, né?"
"Aí resolvemos fazer um plano particular, mas assim foi chegando uma fase que não tinha condições, nós tivemos que cancelar."
"Por enquanto a saúde tá legal também, não tenho precisado tanto".
"Foi onde a gente abriu mão, mesmo."
Como resultado: uma verdadeira debandada.
Entre janeiro e abril deste ano, os planos de saúde já perderam 918 mil clientes. Até o final do ano, o setor estima que um milhão e meio de pessoas possam abandonar o serviço. Somando a queda do ano passado, entre 2015 e 2016, dois milhões e meio de pessoas devem deixar os plano.
De Osasco, na Região Metropolitana de São Paulo, a secretária Adriana Mendes Daniel, de 45 anos, tomou essa difícil decisão.
Tanto no emprego anterior quando no atual, recebeu da empresa contratante a notícia de que não teria direito a um plano de saúde e preferiu não pagar do próprio bolso.
"Quando a gente vê que não vai ter esse direito, que não tem esse direito ao plano, é chato, é triste porque é uma oportunidade de você ter um plano de saúde não pagando tanto quanto um particular. Eu tenho medo de ficar desempregada e precisar de saúde, de atendimento médico e não poder pagar”, contou.
Da cidade de Franca, no interior do estado, os microempresários Raquel e Ederson Aguila tomaram a mesma decisão dez anos atrás. Agora no sistema público, a forma encontrada pelo casal para garantir a saúde no caso de uma emergência, foi fazer uma reserva financeira.
"Se você fizer um depósito por mês, abrir uma poupança de uns R$ 200 por mês fica mais em conta do que você pagar. Então, foi onde a gente abriu mão mesmo", disse.
Neste cenário, o diretor executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde, Antônio Carlos Abbatepaolo, estima que esse seja o pior ano para o setor desde o ano 2000 com até um milhão e meio de cancelamentos.
"Vamos chegar próximo a 1,3 milhão, 1,5 milhão, eu acho que é um número razoável de se falar. Continuando nessa tendência, sem nenhuma novidade, ou um conjunto de medidas que revertam um pouco a situação provavelmente vai ser o pior ano, sim", relatou.
Para o pesquisador Renato Meirelles, do Instituto Data Popular, a queda nos contratos de planos de saúde tem relação direta com o fechamento de postos de trabalho. Ao todo, 66% dos usuários têm planos empresariais. De junho de 2015 para cá, 1 milhão 558 mil vagas de trabalho com carteira assinada foram fechadas.
"Essas pessoas quando perdem o emprego, elas também perdem o direito a esse benefício, o que contribuiu substancialmente pra queda do número de pessoas com serviço privado de saúde por um lado. Do outro lado, o que que a gente via, que os planos de saúde nos últimos anos também deixaram de atender bem a população", alegou.
Realmente, quem escolhe manter o plano parece não estar nada contente com o serviço. Nos últimos doze meses, o portal Reclame Aqui recebeu mais de 63 mil queixas contra as operadoras. Já no Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, os planos aparecem como serviço pior avaliado pelo quarto ano consecutivo. E, em todo Brasil, os Procons somaram mais de 27 mil críticas ao serviço no ano passado.
Solange Beatriz Mendes é presidente da Fenasaúde, a organização que representa o setor. Ela conta que os custos médicos estão subindo mais que o dobro da inflação, o que faz as operadoras terem que reduzir o lucro, encolher o pacote de serviços e tentar melhorar a qualidade para não perder mais clientes.
"Trazer de volta não tem mágica, né, então o que eles estão fazendo é tentando compatibilizar esses clientes que eles ainda tem de poder manter porque até esses que eles tem eles podem vir a perder. O problema é que você está com os custos numa escalada. Agora, se não tivéssemos a crise que estamos vivendo política e econômica no país, o setor ainda assim estaria enfrentando problemas de sustentabilidade", contou
A Agência Nacional de Saúde Suplementar já enviou ao Ministério da Fazenda um pedido para alterar o limite para reajustes nos valores de planos de saúde. A expectativa do setor é de que ele tenha subido de 13,5% para pelo menos 15%, o que deve provocar um novo aumento nos preços do serviço em todo país.