O presidente Michel Temer apostava que
terminaria a semana melhor do que começou. Com anúncio de queda dos
juros e de melhora
nas contas públicas, a expectativa era de uma reversão no
desgaste de imagem causado pela concessão de foro
privilegiado ao amigo e agora ministro Moreira Franco,
citado na delação da Odebrecht.
Temer, um habilidoso negociador
político, acreditava que sairia para o recesso de Carnaval surfando
nos bons índices econômicos. Mas acabou mergulhando em uma crise
política.
Em apenas dois dias, perdeu um aliado
estratégico na equipe ministerial, criou um racha na bancada
peemedebista da Câmara e teve seu ministro da Casa Civil envolvido
em um episódio nebuloso revelado por um ex-assessor do próprio
presidente.
E tudo isso em meio à expectativa de
abertura dos sigilos da delação de 77 executivos da Odebrecht nas
próximas semanas. Os depoimentos estão em poder da
Procuradoria-Geral da República, que deve pedir abertura de
inquéritos contra os citados, incluindo Padilha.
O primeiro revés ocorreu na noite de
quarta (22), quando, por motivos de saúde, o tucano José
Serra pediu
demissão do Ministério de Relações Exteriores.
Temer foi pego de surpresa, afinal
Serra tem sido um dos principais fiadores da aliança entre PMDB e
PSDB no governo.
O presidente imediatamente procurou a
cúpula tucana para negociar o nome do novo ministro, ainda a ser
definido —o favorito, por enquanto, é o senador Aloysio Nunes
Ferreira (PSDB-SP), hoje líder do governo no Senado.
No dia seguinte, uma nova dor de
cabeça: a insatisfação de parte da bancada do PMDB da Câmara com
a escolha
do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) para ministro da
Justiça.
Na semana passada, quando o
ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Carlos Mário
Velloso recusou
convite para assumir o ministério, Temer viu que não
conseguiria nomear um jurista para o cargo.
Outro ex-ministro da corte, Carlos Ayres Britto, já havia
sinalizado que não assumiria a vaga deixada por Alexandre de
Moraes, indicado ao Supremo.
Momentos depois da negativa de
Velloso, um auxiliar próximo do presidente dizia que a "opção
parlamentar é o que lhe restou".
O nome do subchefe para Assuntos
Jurídicos da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha, próximo a Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), chegou a ser ventilado, mas perdeu força.
Temer seguiu o caminho político, mas
não sem ouvir reclamações. O vice-presidente da Câmara, Fábio
Ramalho (PMDB-MG), anunciou rompimento com o governo e avisou que
sua vontade agora é impor seguidas derrotas ao Palácio do Planalto.
Para parte da bancada, com a nomeação o PMDB deixa de ser o
"partido do presidente" para tornar-se apenas um "partido da
base".
MULA
Na noite de quinta (23), o advogado
José Yunes, ex-assessor da Presidência, afirmou
à Folha que que serviu
de "mula" de Padilha.
Ele disse ter recebido a pedido do
ministro um "pacote" em 2014, em seu escritório político em São
Paulo, entregue por Lúcio Funaro, apontado como operador de Eduardo
Cunha (PMDB-RJ).
Yunes prestou depoimento na semana
passada aos procuradores em Brasília - sua versão tem semelhanças
com o teor da delação de Claudio Melo, ex-diretor da Odebrecht, que
contou ter enviado dinheiro ao escritório do advogado após pedido
de Padilha.
O caso deve ser apurado pela
Procuradoria-Geral da República e, segundo auxiliares e assessores
presidenciais, torna a situação do chefe da Casa Civil
"delicadíssima", aumentando a pressão para que ele deixe a
pasta.
Padilha, que ainda não se manifestou
sobre as revelações de Yunes, tirou
licença do governo alegando problemas de saúde. Ele deve
fazer ainda no fim de semana uma cirurgia para retirada da
próstata.
Para o Palácio do Planalto, a partir
de agora o presidente vive uma guerra de versões: ou o ministro da
Casa Civil encontra uma boa explicação para se livrar da história,
ou Michel Temer não terá muita escolha a não ser tirá-lo da Casa
Civil.
ESCOLHAS
O presidente percebeu ainda nos
últimos dias que é preciso lidar com a frustração. Mais do que
isso. O inquilino do terceiro andar do Palácio do Planalto reparou
que nem sempre a saída mais segura –ou a que mais lhe agrada–
poderá ser sua opção final.
O presidente decidiu, por exemplo, que
teria que agradar ao Congresso e a seu partido, o PMDB, que brigava
com foice por mais espaço no governo.
Esboçou então enfrentar
o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e deixar o
deputado André Moura (PSC-SE) na liderança do governo na Casa. Era
um aceno ao centrão, que teria uma forma de interlocução com o
Planalto sem precisar passar por Maia.
Mas não foi bem assim. Mais uma vez
pressionado pelo PMDB –e pelo próprio Maia–, Temer demitiu
Moura e entregou o cargo a Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Maia tinha acertado essa dança das
cadeiras com Ribeiro para garantir o apoio do PP à sua reeleição ao
comando da Casa.
Com o PMDB, ficou a liderança da
maioria, cargo recriado pelo presidente para acomodar mais uma vez
um parlamentar de seu partido. A vaga ficou com Lelo Coimbra
(ES).