“As empresas administradoras de planos de saúde deverão arcar com todo o custeio do tratamento de seus associados, independentemente de previsto em cláusula contratual ou não, ou até mesmo de carência do plano ou não.” Assim se manifestou o desembargador Wanderley Paiva, da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em decisão que condenou a Fundação Forluminas de Seguridade Social (Forluz) a arcar com os custos do tratamento de um usuário do plano de saúde, a ser realizado fora da área geográfica de abrangência do contrato entre as partes.
O menor M.R.S., por meio de seus pais, entrou na Justiça contra a Forluz para que a instituição cobrisse tratamentos médicos a que precisava se submeter na clínica Cepisp, no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Os pais afirmaram que, após o menor ser submetido a vários tratamentos em Divinópolis e em Belo Horizonte, sem sucesso, eles foram informados de que apenas a Cepisp possuía tratamento para a doença que o acometia: crises convulsivas de difícil controle, conhecidas como epilepsia infantil com espasmos.
Os pais alegaram que o caso era de extrema urgência e emergência, pois as crises convulsivas podiam provocar sequelas irreversíveis no bebê, então com sete meses de idade. A Forluz se recusava a pagar pelo procedimento, pelo fato de o Sírio Libanês se encontrar fora da área geográfica de cobertura do plano, conforme cláusula contratual.
Em Primeira Instância, o juiz Fernando Fulgêncio Felicíssimo, da 2ª Vara Cível da comarca de Divinópolis, confirmou pedido de antecipação de tutela e condenou a instituição a custear todas as despesas necessárias ao tratamento da criança, inclusive fora da área geográfica de abrangência do contrato.
A Forluz recorreu, argumentando, entre outros pontos, que o Código de Defesa do Consumidor era inaplicável ao caso, pois a instituição não possui fins lucrativos e era voltada para a autogestão. Afirmou ainda que a cláusula que trata da abrangência geográfica tem respaldo em legislação da Agência Nacional de Saúde (ANS), sendo, portanto, de sua responsabilidade a cobertura contratual apenas em Minas Gerais. Sustentou também que, ao contrário do estipulado na sentença, há, na rede credenciada da Forluz, o tratamento de epilepsia infantil necessário a M.
A instituição afirmou também que M. poderia ter efetuado o procedimento médico por meio do sistema de livre escolha, no hospital por ele requisitado, tendo direito ao reembolso das despesas realizadas fora da rede credenciada, nos limites dos valores acordados. Sustentou ainda que a sentença violava princípios constitucionais e indicava quebra do equilíbrio econômico financeiro dos ajustes celebrados entre as partes.
Relações contratuais
Na avaliação do desembargador relator, Wanderley Paiva, ainda que a Forluz seja uma associação sem fins lucrativos, ela firmou contrato de prestação de serviços, mediante pagamento, por isso o caso deveria ser visto à luz do CDC.
Em relação à cláusula que limitava a cobertura geográfica, o desembargador verificou que M. tentou tratamento em Minas Gerais, sem obter sucesso, tendo os próprios médicos do hospital de Belo Horizonte credenciado à Forluz sugerido o Sírio Libanês. O hospital de São Paulo, em ofício, afirmou ser a única instituição do país com equipamento com 64 canais para o tratamento necessário a M. Considerando a cláusula contratual de limitação geográfica abusiva e incompatível com a boa-fé que deve reger as relações contratuais, o relator julgou-a nula.
“Diante do exposto e da comprovação de que o autor/apelado tenha esgotado a chance de tratamento eficaz no estado de Minas Gerais (área de abrangência), e diante da indicação do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, o qual dispõe de equipamento específico para o tratamento, sendo o único nosocômio do país, patente é a manutenção da sentença hostilizada”, declarou o relator.
Os desembargadores Alexandre Santiago e Mariza de Melo Porto votaram de acordo com o relator.
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