A administradora Luísa Cusnir
trabalhava na divisão de saúde de uma corretora de seguros e
decidiu pesquisar por que o número de sinistros era tão alto.
Descobriu que a maior parte das doenças – inclusive aquelas
tratadas em pronto-socorro, como enxaqueca e sinusite – poderiam
ser evitadas com prevenção baseada em alimentação adCom ajuda de
tecnologia, novatas podem otimizar consultas, exames e até mesmo
cirurgias, barateando custos
Toda semana ao menos um paciente do
cirurgião cardiovascular Marcus Vinicius Gimenes lhe fazia o mesmo
pedido. “Doutor, não tenho mais plano de saúde, o senhor pode me
dar um desconto na consulta particular?” De tanto ouvir a frase,
Gimenes usou sua veia empreendedora para criar o Consulta do Bem. A
startup, baseada no conceito de economia compartilhada, oferece
consultas, exames, vacinas e até cirurgias a preços acessíveis para
quem não tem plano de saúde.
A empresa foi comprada, há cerca de
um mês, pela BenCorp, gestora especializada em benefícios de saúde
para o setor corporativo. Gimenes, porém, não foi o único a
explorar o filão: há diversas startups surgindo com foco em quem
não tem seguro-saúde. De 2014 para cá, o total de brasileiros
clientes ativos desse setor caiu 6%, para menos de um quarto da
população.
Assim como outros exemplos da
economia compartilhada, o segredo do Consulta do Bem é usar
recursos subaproveitados – no caso, horários vagos de médicos em
seus consultórios. Com o apoio da tecnologia, é possível aproveitar
o efeito de rede para ocupar esses espaços. Na média, diz Gimenes,
esse tempo ocioso corresponde a metade do período de trabalho dos
profissionais.
Ao usar o serviço da startup, o
paciente agenda uma consulta com um dos 3 mil profissionais
cadastrados na plataforma, a partir de horários previamente
oferecidos pelo médico. O pagamento é feito na hora, pela internet
– e cada sessão sai por R$ 100, um terço do preço de uma consulta
normal. “Como o pagamento é feito antes da consulta, as ausências
despencam. O paciente consegue pagar menos, e o médico aproveita
melhor seu tempo”, diz o fundador da Consulta do Bem.
Para os pacientes, a empresa tem um
sistema parecido com o do Dr. Consulta, pioneira no setor, criada
em 2011. Pelo site ou aplicativo da empresa, é possível agendar
visitas a médicos, dentistas, marcar exames e pequenas cirurgias. A
diferença é que os profissionais do Dr. Consulta atendem não em
consultórios próprios, mas nas mais de 60 clínicas da startup, hoje
distribuídas entre São Paulo e Rio de Janeiro.
Clube
A tecnologia também foi o que
permitiu o nascimento da Dandelin, em abril de 2018. É uma espécie
de clube de saúde: o usuário acessa o app da empresa e, se
precisar, marca seu procedimento com um dos mais de 400 médicos
cadastrados. No fim do mês, a startup soma quantas consultas foram
realizadas por seus clientes e divide os custos entre os
“sócios”.
O usuário, portanto, paga uma
assinatura de custo variável – algo como a conta de água em um
condomínio, por exemplo. Pode haver mês que o usuário fez cinco
consultas e paga o equivalente a uma, assim como mês em que ele não
vai ao médico e terá de pagar. “Invariavelmente, é bem menos que o
valor da mensalidade do plano. Hoje, o máximo que se paga são R$
100 por mês”, diz Mara Redigolo, cofundadora e diretora de
operações da Dandelin.
Tendência
Para especialistas, os serviços que
miram aqueles que não têm planos de saúde tendem a crescer, porque
há indícios de que os convênios médicos fiquem ainda mais caros. “A
população está envelhecendo, o que aumenta a incidência de doenças
crônicas e a complexidade nos tratamentos, subindo também o custo
das mensalidades”, afirma Leonardo Nunes, especialista em saúde da
Cèdre Consultoria.
Além disso, o número de
profissionais informais ultrapassou o de trabalhadores com carteira
assinada pela primeira vez em cinco anos em 2017 – situação que
ainda não foi revertida. Hoje, os planos de saúde individuais
chegam a ser até 58% mais caros do que os coletivos, dependendo da
região do país, o que torna os convênios inacessíveis para mais
pessoas – os dados são da Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS).
Integração
Depois de se formar na Universidade
Harvard e trabalhar dois anos no Quora, rede social de perguntas do
Vale do Silício, a engenheira Deborah Alves voltou ao Brasil em
maio de 2018 para colocar no ar a Cuidas, serviço voltado à saúde
da família. Com foco corporativo, a companhia já conquistou cinco
empresas como clientes – cada uma delas paga R$ 70 por mês para
cada funcionário cadastrado, que pode usar serviços de
acompanhamento de sua saúde. Além de consultas marcadas, a Cuidas
também deixa que o usuário tire dúvidas em tempo real, pelo
celular, resolvendo problemas comuns ou indicações de
especialistas.
“Para empresas que têm plano, é
algo que diminui a sinistralidade e as faltas de funcionários que
vão ao médico”, diz Deborah. “Já para as corporações que não têm, é
um benefício que pode ajudar a atrair talentos.” Apesar de ter
menos de um ano, a Cuidas já recebeu investimentos dos fundos
Kaszek Ventures e Canary. Além da mensalidade paga pelas empresas,
a Cuidas também fatura por consulta – recebe, em média, R$ 20 por
sessão agendada.
Atuar ao lado dos planos de saúde
também é a meta da Central da Saúde, fundada em 2011 pelo
empreendedor Bruno Peres. A empresa leva fonoaudiólogos,
fisioterapeutas e outros profissionais à casa dos pacientes –
muitas vezes, esses tratamentos não são cobertos pelos planos de
saúde. Com mil profissionais parceiros, que realizam, em média, 5
mil procedimentos por mês, a empresa fechou 2018 com receita na
casa de R$ 4 milhões. “O médico salva, mas é o fisioterapeuta que
devolve a vida ao paciente”, brinca Peres.
Prevenção também vira
negócio para startups
A administradora Luísa Cusnir
trabalhava na divisão de saúde de uma corretora de seguros e
decidiu pesquisar por que o número de sinistros era tão alto.
Descobriu que a maior parte das doenças – inclusive aquelas
tratadas em pronto-socorro, como enxaqueca e sinusite – poderiam
ser evitadas com prevenção baseada em alimentação adequada. Com
esses dados em mãos, fundou em 2016 a N2B, empresa que auxilia as
pessoas a se alimentarem melhor.
Após receber investimento de R$ 150
mil da aceleradora de startups Ace há dois anos, além de um aporte
recente e de valor não revelado da Sociedade Israelita Albert
Einstein, a empresa soma 700 novos cadastros ao dia; hoje, já tem
60 mil usuários.
Os clientes podem mandar para a N2B
quantas vezes quiserem imagens de suas refeições e um time de
nutricionistas os ajudam remotamente a entender se estão se
nutrindo de acordo com suas necessidades de saúde. “Só o fato de
nos enviar as imagens dos alimentos já melhora a consciência sobre
o quanto aquilo é saudável e, assim, tendem a ter menos de ir ao
médico ou hospital”, explica Luísa.