Cinco pacientes que ficaram com sequelas graves após sofrer um
acidente vascular cerebral (AVC) têm mostrado pequenos sinais de
recuperação após a injeção de células-tronco no cérebro.
Os cinco pacientes estão participando de um teste clínico no
Southern General Hospital, em Glasgow, na Escócia, envolvendo nove
pacientes na faixa dos 60, 70 e 80 anos. A pesquisa, uma das
primeiras do mundo desse tipo, pretende avaliar se o procedimento,
que envolve a injeção de células-tronco na parte danificada do
cérebro, é seguro.
Keith Muir, da Universidade de Glasgow, responsável pelo
experimento, disse à BBC estar "surpreso" com a melhora, que vai de
leve a moderada, dos cinco pacientes.
Ele ressalta que ainda é muito cedo para dizer se o efeito é
resultado do tratamento que os pacientes estão recebendo.
Já foi bastante documentado que o sentimento de bem-estar
resultante de uma atenção médica especial dada a pacientes,
conhecido como efeito placebo, pode ter uma ação positiva sobre a
saúde das pessoas.
Os resultados, que serão apresentados nesta terça-feira na
European Stroke Conference (Conferência Europeia sobre Derrame) em
Londres, mostram que até agora não houve efeitos adversos nos
pacientes, e que mais da metade dos participantes têm apresentado
algum tipo de melhora.
Melhoras que fazem diferença
Todos os pacientes envolvidos no estudo sofreram um derrame
entre seis meses e cinco anos antes de receber o tratamento. De
acordo com Keith, a recuperação de qualquer um deles não era
esperada. "Parece estranho que essa melhora seja apenas por acaso
ou um efeito placebo", Keith disse à BBC.
"Estamos vendo coisas que são interessantes e um pouco
surpreendentes. Temos visto pessoas que agora têm a capacidade de
mover os dedos depois de vários anos de paralisia completa. Temos
visto pacientes que foram capazes de andar dentro de casa enquanto
anteriormente dependiam da ajuda, e pessoas que passaram a
reconhecer o que está acontecendo ao seu redor."
"Minha expectativa era de que veríamos uma mudança muito
pequena, e se houvesse alguma mudança, seria uma mudança
relativamente curta, que não duraria muito tempo. (Mas) temos visto
mudanças que foram mantidas ao longo do tempo", disse Keith.
Frank Marsh, de 80 anos, teve um acidente vascular cerebral há
cinco anos. Antes do derrame, Frank, um ex-professor, estava em
forma e era um bastante ativo pianista e membro de um coral.
O AVC o deixou com pouca força e coordenação na mão esquerda, e
falta de equilíbrio. Ele precisa de uma bengala para ajudá-lo a
mover-se ao redor da casa e não pode mais tocar piano.
Após a injeção de células-tronco na área danificada do cérebro,
o equilíbrio e a mobilidade melhoraram, assim como sua força na
mão. Ele agora pode amarrar o cadarço de seus sapatos.
"Agora posso segurar as coisas que eu não conseguia aderência
antes, como os corrimãos nas piscinas", disse Frank.
Segunda fase
Clare, esposa de Frank, que também é professora, afirmou que as
pequenas melhoras deixaram Frank mais independente. "Ele atingiu um
estágio após o derrame em que não estava mais apresentando
melhoras," disse Clare. "Mas, após a operação, ele é capaz de fazer
coisas que não podia fazer antes, como fazer café, vestir-se e
segurar as coisas."
Frank acrescentou que espera que as melhoras continuem: "Eu
gostaria de voltar para o meu piano. Eu gostaria de andar um pouco
mais e mais firme".
No entanto, Clare sente que não haverá mais progressos para o
seu marido, mas espera que outros possam se beneficiar do teste
clínico.
"O grande potencial do experimento é o que ele pode fazer para o
futuro", disse Clare. "Eu disse a Frank no início que o tratamento
poderia não ajudá-lo, mas poderia ajudar seu neto."
Clare está certa, mesmo que se prove que o tratamento com
células-tronco funciona, será um longo caminho até que ele esteja
amplamente disponível.
Os resultados até agora abrem caminho para uma segunda fase do
ensaio clínico que deverá começar no final deste ano, e pretende
determinar se as melhoras realmente resultam do tratamento.
Se a fase dois confirmar que as células tronco são a causa das
melhoras, uma terceira fase será necessária para avaliar para que
tipo de paciente o tratamento será mais adequado, e em que estágio
ele será mais eficaz.
Aprovação ética
Comentando a pesquisa, Clare Walton da Stroke Association,
disse: "O uso de células-tronco é uma técnica promissora que poderá
ajudar a reverter alguns dos efeitos incapacitantes de acidente
vascular cerebral. Estamos muito entusiasmados com este ensaio
clínico, no entanto, estamos no início de um longo caminho, e um
desenvolvimento significativo é necessário antes da terapia celular
poder ser considerada um possível tratamento. "
As células-tronco foram criadas há 10 anos a partir de uma
amostra de tecido nervoso retirada de um feto. A empresa que produz
as células-tronco, ReNeuron, é capaz de fabricar quantas
células-tronco precisar a partir da amostra inicial.
O tratamento com células-tronco tem sido criticado justamente
por envolver o aproveitamento de amostras fetais. Entre seus
principais críticos está o parlamentar e ativista antiaborto David
Alton. "O verdadeiro doador (o feto) não poderia ter dado o seu
consentimento e por isso esse tipo de tratamento levanta questões
éticas importantes", diz ele.
ReNeuron, que financiou o estudo, diz que o experimento tem
aprovação ética das autoridades reguladoras. A empresa acrescenta
que a amostra de tecido foi utilizada no desenvolvimento da
célula-tronco há 10 anos, e que material fetal não tem sido
utilizado desde então.