O setor de seguros será muito
afetado pelas consequências da pandemia do novo coronavírus neste
ano de 2020, e também em 2021, mas as perspectivas são de
gradual retomada, com o fortalecimento de sua credibilidade e de
suas condições de atendimento à população. O desempenho resiliente
das seguradoras brasileiras nada fica a dever ao de outros países,
mostrando o alto padrão de eficiência que alcançaram, ao colocar
rapidamente a imensa maioria de funcionários em regime
de home office, com assistência remota e tecnologia
para manter o atendimento a todos os clientes. O futuro ainda
guarda muitas incógnitas, mas uma coisa é certa: todos sairão mais
digitais, criativos e com produtos desenvolvidos para atender a
antigas e novas demandas dos consumidores na era pós-COVID-19.
Essas foram as principais mensagens
transmitidas durante o webinar “Pandemia e o Mercado de Seguros no
Mundo”, realizado pela Confederação Nacional das Seguradoras
(CNseg). Participaram, coordenando o debate, o Presidente da CNseg,
Marcio Coriolano, e os CEOs de três grandes seguradoras
multinacionais: Edson Franco, da Zurich Minas Brasil Seguros; José
Ferrara, da Tokio Marine Seguradora e Luis Gutiérrez, da Mapfre
Seguros. Os quatro executivos integram o Conselho Diretor da
CNseg.
“O nosso setor segurador será
duramente afetado por esta crise epidemiológica e
econômica. Assim como os mercados de seguros do mundo todo. O
ponto de partida aqui do nosso webinar é exatamente mostrar que os
seguros não são uma ‘jabuticaba’ brasileira. Ao contrário, os
fundamentos são os mesmos, globalmente. E todos os países estão
sendo afetados da mesma maneira, defendendo os mesmos conceitos e
buscando soluções semelhantes. O que varia é a estrutura e
funcionamento e o grau de maturidade dos seguros em cada país.”
Essa foi a síntese da abertura de Marcio Coriolano no encontro que
contou com a participação remota de mais de 1.100 pessoas.
A ideia dos debatedores foi trazer
aos mais de mil participantes sobre como outros países estão
lidando com a situação. “Os fundamentos do setor de seguros são
universais e isso é importante para que possamos observar e trocar
experiências para enfrentar essa ameaça mundial absolutamente
imprevista”, afirmou Coriolano.
A Global Federation of Insurance
Associations (GFIA), uma organização mundial que reúne as
seguradoras, foi citada pelo Presidente da CNseg pela publicação de
uma declaração na qual afirma que a indústria de seguros global a
principal força estabilizadora que o mundo tem hoje, ao repor
financeiramente perdas seguradas. O órgão multinacional também
reforçou que em face à pandemia, todos os seguradores implementaram
planos de continuidade de negócios, que incluem cuidar dos
funcionários, colocando todos em teletrabalho; garantir atendimento
aos clientes e flexibilizar indenizações nos seguros de vida, mesmo
com exclusão de pandemias; até disponibilizar um elevado volume
financeiro para doações dedicadas a ajudar a conter a
COVID-19.
Marcio Coriolano também comentou
que a GFIA admite flexibilização de coberturas, mas sem abrir mão
do fundamento universal das exclusões de pandemias, sem o que as
representadas poderiam simplesmente falir. Aproveitou para citar o
posicionamento da Association of British Insurance (ABI), a CNseg
britânica, que reforça a urgência de defesa da solvência dos
mercados. “A ABI esclarece que nenhum país é capaz de oferecer
cobertura total para todo mundo e que o envolvimento dos governos
neste momento tem de ser ativo, como temos observado aqui com o
executivo federal garantindo liquidez para os mercados, renda para
os pobres e empréstimos para a recuperação de empresas. Com o nosso
setor não pode ser diferente”, esclareceu.
A primeira lição que fica, segundo
Edson Franco, da Zurich, é que não é hora de negacionismo ou
minimização do problema. “O momento é de uma crise sem precedentes.
As consequências econômicas, com recessão e desemprego recorde,
afetam a todos. E todos sabemos que é uma crise que não estará
contida dentro de 2020. Vai se arrastar para 2021. Na comparação
com outros países percebemos que não somos tão diferentes assim. A
resposta demanda ações de governos, empresas e individuais. Nossa
responsabilidade social é importante e vemos isso em todo o setor
nas centenas de ações divulgadas. As empresas devem dar sim a sua
contribuição e nós como indivíduos podemos contribuir de forma
material, financeira e de respeito ao próximo. A história é uma
ótima professora. Já o pânico, um péssimo
conselheiro. ”
Segundo Luis Gutiérrez, da Mapfre,
nos vários mercados onde o grupo atua, seguradoras, corretores e
prestadores de serviços dão uma resposta muito positiva desde o
início da crise. “Ninguém estava pronto para uma situação que afeta
todos os países e todos os setores econômicos. Os governos
divulgam medidas financeiras para apoiar a sociedade. Na Espanha
sofremos muito com tantas mortes e por isso sentimos a obrigação de
flexibilizar o pagamento do seguro de vida, mesmo com a exclusão
nas apólices. Todos adotam flexibilizações. O Brasil está sofrendo
os mesmos efeitos e adota as mesmas ações de outros países.”
José Ferrara resumiu a atuação do
grupo Tokio, que atua em 46 países do mundo. “Todos os países
asiáticos estão fechados, com exceção da China que retoma as
atividades desde meados de abril, mas mesmo assim preserva os
grupos de riscos. Todos atuam com horário flexível para garantir o
distanciamento social de dois metros entre as pessoas”. Ele contou
também que a matriz da empresa anunciou dia 4 de maio um fundo
mundial para ajudar todos os países onde a Tokio Marine tem
presença. O volume de ajuda que o grupo local tiver possibilidade
de oferecer à sociedade, a matriz colocará 50% mais. “Tenho certeza
de que é um bom funding para todos os países em
que opera.”
Sobre a inserção do País no
contexto internacional, Ferrara foi enfático: “No Brasil, a
indústria securitária não deve nada para a indústria bancária.
Todos nós conseguimos colocar todos os funcionários
em home office. Tudo funcionando bem. Não só as
seguradoras. Os corretores também conseguem operar em home
office com as ferramentas que as seguradoras colocaram à
disposição deles. Uma mudança de comportamento. Se os
corretores pensavam que a tecnologia iria substitui-los agora eles
sabem que veio mesmo foi para ajudar todos nós a vendermos
mais.”
De acordo com os estudos locais e
internacionais, o seguro não vive se não houver previsibilidade.
“Todos os países visam preservar as cláusulas, a despeito de
soluções flexíveis que têm sido adotadas como foi no seguro de
vida. Nenhum país pode sair rasgando contratos, pois isso pode
afetar a solvência das empresas”, voltou a afirmar Marcio
Coriolano.
Todos foram unânimes em lembrar que
em menos de uma semana o setor de seguros estava operando
em home office, sem qualquer prejuízo para
funcionários e consumidores. Isso demostra o quão preparada a
indústria de seguros está.
Essas primeiras abordagens, foram
sucedidas de questões endereçadas aos convidados por Marcio
Coriolano, que agrupou os temas mais frequentemente colocados pelo
público para as perspectivas pós-COVID: o crescimento do mercado, o
novo consumidor, os novos produtos e o papel do corretor de
seguros.
Qual será o crescimento de
mercado?
Eis a pergunta mais frequente no
webinar. José Ferrara espera uma queda entre 5% e 10% nas vendas da
companhia em 2020, com retomada significativa já em 2012. “Em
automóvel há uma queda natural por conta das vendas de carros
novas, com recuo de 70% segundo dados da indústria automobilística.
O que se vende neste ano são caminhões, tratores e equipamentos
agrícolas. Mas todos sabem que o mercado de veículos leves tem tudo
para se recuperar. Com certeza, o Brasil vai ser a bola da vez, e
sair de 6% para 12% na penetração de seguros no PIB”, afirmou.
Luis Gutiérrez afirmou ser muito
difícil saber. “Vai depender do impacto do confinamento. Qual vai
ser a evolução do seguro do jeito que conhecemos? Quais as
oportunidades de um mercado emergente, levando-se em consideração
que há um grande núcleo da população que não tem acesso. O
brasileiro está mais disposto a escutar sobre seguro. Mas tem de
ter uma oferta ativa. Venda consultiva, que análise as necessidades
do cliente e não oferte o produto que tem pronto. É preciso
questionar: o consumidor precisa disso? Escutemos os clientes para
saber quais são as suas demandas. Temos de pensar que o mundo está
mudando. E precisamos mudar junto para crescer”.
Edson Franco também afirmou ser
muito difícil saber qual será o percentual de queda nas vendas em
2020. “Não sabemos a extensão, a duração da quarentena, ou se
teremos agravamento de lockdown. Naturalmente, hoje
todos nós estamos fazendo as nossas projeções e dependendo
do mix de cada seguradora o impacto será
diferente. O efeito em resultado acaba sendo amortecido, mas tende
a durar mais tempo. Nos cabe ser realistas no planeamento e
otimistas na execução. Vamos nos planejar para diferentes
cenários”.
Marcio Coriolano lembrou que no ano
passado o setor avançou 12,2% em termos nominais, o que significa e
8,7% em termos reais. “A maioria dos setores econômicos não
conseguiu isso”, ressaltou. Em fevereiro deste ano, na analise de
doze meses, o setor cresceu 12,7%. “É certo que a partir do segundo
semestre veremos uma outra tendência. Mas o setor vai ter o
benefício do carregamento de contratos feitos no ano passado, o que
vai nos ajudar a ter um bom desempenho no primeiro semestre. Mas o
segundo semestre é a grande incógnita, pois ainda não sabemos o
tamanho da queda da produção, emprego e renda, que são os
combustíveis dos seguros, nem quanto tempo vai durar o
distanciamento”, comentou.
Como será esse novo
consumidor?
Todos se perguntam que mudanças de
comportamento dos consumidores vão ser permanentes. “Demos um salto
de digitalização. Vemos um Congresso Nacional e um Supremo Tribunal
Federal tomando suas decisões por meio de videoconferência. Houve
uma quebra de paradigmas. Isso vai nos levar a uma sociedade sem
dinheiro em papel? As empresas vão usar menos metros quadrados para
seus escritórios uma vez que o trabalho remoto é realidade? As
pessoas vão preferir comprar produtos
no e-commerce do que sair para ir passear nas
lojas? Todos vão reinventar negócios ou voltarão aos hábitos antes
da pandemia? Essas são respostas que ainda não tempos. Mas sabemos
que temos de nos preparar para sermos mais competitivos”, disse
Franco.
Quais os principais
produtos demandados por este consumidor?
Esta resposta ainda também é
incerta, mas o que se sabe, pelas pesquisas já divulgadas, é que
seguros de vida e de saúde seguirão na lista de desejos. Certamente
também haverá demanda para os riscos excluídos. Todos os
participantes afirmaram que há muitas oportunidades em termos de
produtos, uma vez que a pandemia expôs à sociedade que o mundo tem
muitos riscos. Os conhecidos, como danos causados pela natureza, e
os desconhecidos como ataques cibernéticos e pandemias. “Temos de
juntos discutir novos produtos para atender riscos gravosos, uma
demanda que já vinha antes da pandemia. E agora com pandemia, quais
produtos podemos ofertar. Devemos pensar nisso já”, disse Ferrara.
Gutiérrez acrescentou: “Temos de agir. Colocar em prática esses
produtos que serão demandados. E ninguém melhor do que o corretor
para nos trazer quais são esses riscos que seus clientes estão
preocupados ou expostos”.
Qual o papel do corretor,
se realmente houver um novo mundo?
Digitalização não é
desintermediação, afirmou Franco. Só quem está no dia a dia, ao
lado do cliente para saber quais os riscos mais os aflige. “O que
temos é uma venda mais consultiva. O corretor é um consultor de
riscos para seus clientes. Essa é a mudança. E a ferramenta
tecnológica é fundamental neste cenário”, disse Franco. Nenhum dos
participantes do debate acredita na desintermediação e sim na
profissionalização e num processo mais digital.
Gutiérrez acrescentou: “Chega de
pensar e falar, vamos fazer. Somos capazes de fazer juntos. Não
existe um mercado para seguradoras, para corretoras.
Dependemos todos uns dos outros. Temos de agir. Colocar
em prática produtos que serão demandados. E ninguém melhor do que o
corretor para nos trazer quais são esses riscos que seus clientes
estão preocupados ou expostos. Temos de estar em todas as frentes
que os consumidores exigirem, seja analógica ou digital. Juntos
estamos construindo um setor cada dia melhor”.
Marcio Coriolano encerrou o debate,
que se estendeu por quase 1 hora e 15 minutos dado a importância do
tema e das perguntas. Ao agradecer aos convidados e público que
assistiu, emendou: “Sou um apaixonado pelo mercado de seguros.
Tenho confiança de estar num setor que continua sendo construído
com dedicação e competência. Tenho muito orgulho do nível de
qualificação que o setor chegou nos dias de hoje. Entrou nesta
crise já tendo enfrentado a recessão recente e sabendo que o
‘mimimi’ acabou. O consumidor está empoderado e mais
consciente de sua posição privilegiada no mercado, e os corretores
estão fortalecidos pela sua luta e ação dos últimos anos para
enfrentar este novo cenário desafiador”.